Neste meio tempo, enquanto Momiji viajava, Lune, apesar de
tudo, tentava estudar para se distrair das preocupações e espantar a tristeza,
mas também para se preparar para o difícil exame admissional que teria de
enfrentar.
Ela aproveitava que estava o dia todo em casa sozinha, já
que Takeo já estava trabalhando, para suas tentativas de se concentrar nos estudos.
Mas estava difícil ! O que poderia resultar desta viagem
era imprevisível em suas consequências, e ela não sabia como iria ficar o
relacionamento das famílias Tamasuky e Soryu,e nem como a família Soryu
reagiria ‘as notícias.
O que Otaru fizera era extremamente grave, e certamente
não seria perdoado por nenhuma das duas famílias, pensou Lune consigo mesma,
mas...ela simplesmente, apesar de tudo, não conseguia odiar o próprio irmão.
Para ela, ele ainda era o menininho do qual ela foi babá anos atrás, do qual
cuidou com carinho e dedicação, e ela só queria ser respeitada por ele e que
ele respeitasse os limites fraternais com ela.Ela, claro, reprovava muito a
nova vida que ele atraiu para si, uma
vida de crimes bárbaros, mas ele estava completamente fora das possibilidades
de controle dela sobre ele, jamais o convenceria a se entregar para a polícia e
pagar por seus crimes.Ela sabia que tal poder não estava sob o alcance dela.
Foi então, no dia seguinte de manhã, após tentativas
infrutíferas de estudar, após Takeo jpa ter saído para o trabalho, que o
telefone tocou:
-Alô?
-Oi, filha, sou eu. Sua mãe já chegou da China, e precisa
urgentemente de seu apoio...
-Estou a caminho, é para já !
Lune desligou o telefone, se trocou correndo, pegou seu
carro e foi voando para a casa de seus pais.
Chegando lá, encontrou Momiji prostrada, desolada,
chorando de modo convulsivo.
Lune a abraçou e acariciou seus cabelos com carinho, e
depois de algum tempo, aos soluços, com voz embargada e depressiva, contou o
que viu na China, e o que aconteceu.
-Nunca me doeu tanto bater em meu filho...mas o que vi me
doeu mais, muito, muito mais...eu...eu não sei mais o que pensar, e seu pai já
está desesperado em suas tentativas de
me consolar, ai...vida maldita !Por que tenho de continuar a viver?Por que
tenho de viver, viver para quê?Para ver a tragédia...e se seu irmão for preso,
ou morto...eu me sinto enganada, traída, mas eu...eu não consigo odiá-lo, ainda
que ele seja um monstro, um monstro criminoso e insensível e...não foi esta a
educação que dei a ele, eu...eu falhei como mãe, eu falhei, falhei, a culpa é
minha, toda minha, eu mereço ser punida...
-Mãe, por favor, não pense assim, a senhora não teve culpa
de nada, a senhora não falhou...sabe, as pessoas, os filhos, um dia pensam por
si sós, não são cópias fiéis dos pais, tomam suas próprias atitudes e decisões
nas vidas dele, depois de uma certa idade, não estão mais sob o controle dos
pais, e muitas vezes trilham caminhos errados...
-Mas não é só isto, filha! Ele...ele..ele já tinha
tendência para este caminho desde criança, como nunca percebi?Como pude ser tão
cega?Filha, eu conversei com a Ruri sobre ele e ela me revelou segredos que ela
guardava consigo há muito tempo...que ele abusava dela desde criança, que
entrava escondido no quarto dela e fazia mão boba nela, a beijava na boca, e
coisas piores, e depois que ela se desenvolveu, ele a perseguia secretamente e
uma vez quase a estuprou, mas ela tinha tanta vergonha, que nunca contou a
ninguém!Eu fiquei tão chocada...apesar de eu ter visto aquela cena horrível lá
na China, ainda assim me choquei com estes fatos do passado...não sei...não sei
o que pensar...pior...pior que eu tenho de dar satisfações aos Soryu, e o que
direi?Eu não sei mentir, eu odeio mentiras, eu não sou falsa, não consigo
enganar a ninguém, mas...ai...coitadinha da Megumi-chan...como vão reagir...
-Mãe, a senhora sempre me ensinou que não importa as consequências
depois, sempre devemos contar a verdade. Acho que, apesar de tudo, nossas
famílias não merecem romper relações por causa dele. Eles não tem culpa do Onii-chan
ter feito o que fez e se evadido para a China. Mesmo que ele estivesse conosco,
ele teria feito a mesma coisa. Acho que devemos agir civilizadamente e chegar
em um acordo, pois nenhuma das duas famílias tem culpa.
-Mas minha vergonha é tanta, filha...como eu vou poder
olhar nos olhos dos Soryu, depois de tudo isto acontecido?Eu...eu
...simpleesmente não conseguiria falar nada...
-Então deixe comigo, mãe. Eu vou viajar agora mesmo para
Nagoya e falar com eles, depois marcaremos um encontro das duas famílias para
resolvermos tudo isto, e decidirmos juntos o que fazer.
-Muito obrigada, filha, eu...eu realmente não estou em
condições, filha...
-Mãezinha, olhe nos meus olhos...
Momiji olhou, levantando a cabeça com esforço.
-Eu a amo e confio na senhora !
E Lune deu um beijo no rosto dela.
As duas se abraçaram de novo, e novo pranto se sucedeu.
Depois que as duas se recuperaram, Lune foi dar um apoio
moral ao pai dela e acalmá-lo e contou a ele seu plano.
Então telefonou para Motoko, a mãe de Takeo:
-Alô, quem é?
-É a Lune-san, Motoko-sempai !
-Oooi, Lune-san, e aí, tem notícias de seu irmão?
-Tenho sim, mas prefiro contar pessoalmente, poso ir aí
agora?
-Claro, Lune-san, vai ser um prazer, vem sim, estaremos a
esperando !
-Muito obrigada, Motoko-sempai, até já !
Depois então, pegou seu carro e rumou para Nagoya.
No meio do caminho parou em um posto de gasolina, encheu o
tanque e almoçou no restaurante fast food ao lado.
Então retomou a viagem. Eram duas da tarde quando chegou
em Nagoya, na mansão dos Soryu.
(Por Continuar)