Não faz tanto tempo assim, apenas doze mil anos atrás.
Foi um tempo de outros homens, foi um tempo de outros animais. Foi um tempo de
sobreviventes, em que o tempo parecia eterno, tão eterno como o inverno
glacial, um tempo em que tudo o que era vivo teve de provar seu valor ,na
perseguição pelo prêmio maior: a sobrevivência!
Hupp, o cavalo estava guiando seu rebanho por um lugar
perigoso, que lhe era estranho. Seguia galopando quando a neve terminou e um
lago congelado se iniciava. Era uma madrugada escura, gelada e agourenta. Os
cavalos seguiram pelo lago com cuidado, pois era escorregadio. Eles não tinham
idéia do quanto o gelo era fino. Mas pressentiam a presença de predadores, e
estavam nervosos e preocupados. Já bem distantes das margens, ouviram um uivo,
depois outro e outro, e um coro se ouviu, deixando-os mais gelados ainda, de
pavor, não bastasse o frio intenso e cortante. Um passo, dois passos...
Crack !
O gelo se partiu. Hupp caiu na água congelante, ate quase
os ombros, e tentava escapar dali de qualquer jeito. Afundou, voltou a tona, a
beira da hipotermia, não conseguia nadar, a água começando a se congelar em
volta de seu corpo, a respiração quase impossível, exaustiva.
Repentinamente ,a pupila do olho direito se dilatou,
o coração acelerou-se com violência,
quase em taquicardia, uma enorme descarga de adrenalina inundou seu corpo, em puro pânico:
Um lobo gigante, aproximou -se com sua alcatéia logo
atras de si. .Hupp, em desespero mais se debatia quanto mais aquela dentuça
alva a mostra se aproximava. A mordida fatal estava chegando. E não foi
necessária.
O pavor fora tão grande que o coração de Hupp parara. O
choque hipotérmico também contribuiu para isto.
Os outros cavalos caíram na mesma armadilha, e a
alcatéia, esfomeada por dias de inanição, se banqueteou com as cabeças,
pescoços e costas dos cavalos, já que eram as únicas partes a ficarem expostas
fora da água congelada, onde os lobos gigantes, espertos e experientes, sabiam
que não deveriam ceder a tentação de entrar. O gelo conservou as partes das
carcaças dos cavalos que estavam abaixo dele como se fossem vivos, mas o lago ficou com uma
aparência ainda mais tétrica, com as caveiras dos cavalos acima da linha
d’água.
Xer- Nosman ouviu os uivos e os relinchos desesperados
ecoando e desaparecendo no horizonte. O adolescente Cro – Magnon, a primeira raça de homens
modernos que existiu, muito parecida com os homens atuais, mas que não existe
mais, saiu da boca da caverna e entrou de novo para o conforto do fogo.
- Ouviste os chamados, meu pai?
- Sim. Os lobos gigantes. Mas o que me preocupa, meu
filho, e’ a Morte de Dentes Longos!
- Eu nunca a vi.
- Espero que nunca a veja, filho. Quem a vê, geralmente
morre. Você teve sorte, ela ainda não descobriu nosso novo esconderijo.
Estavam falando do terrifico felino de dentes de sabre,
Smilodon callifornicus, pouco maior, mas muito mais forte do que os leões da
atualidade.
- Uooreeeeaaaargh!
- Urspel anda de mau humor hoje.
-Sim, filho, e isto e’ mau sinal. Mas pelo menos os
ursos das cavernas são mais comuns do que os bem raros Ursos gigantes, ainda
mais terríveis do que as Mortes de Dentes Longos !
-Mas nunca nenhum Deus Urso nos atacou. Nos e que sempre
os matamos.
Ele se referia ao Urso das Cavernas, maior que os
atuais, mas predominantemente herbívoro e normalmente manso
-Acho que o Xaman já lhe explicou isto, filho, os Deuses
nunca morrem, nos matamos apenas seu corpo. Seu espirito vive sempre.
- Como a Morte dos Dentes Longos?
- Respeite a Deusa da morte, filho. Ela e’ ma’, ela e’
cruel, ela e’ nosso pesadelo. Ela também vive sempre.
- Nunca ninguém tentou enfrenta-la?
- Os poucos
homens que tentaram, e foram poucos, estão todos mortos. Não se consegue
enfrentar um Deus mau. Ele não nos da’ o corpo dele como os Bons Deuses,
especialmente o Deus Urso. Como lhe disse, eles são maus.
- Uh! Ainda esta’ escuro .Melhor dormir.
- Isto ,filho. Quando amanhecer, teremos de caçar
novamente.
- O que acha que os lobos fizeram aos cavalos?
- Deixe os espíritos dos cavalos em paz. Os lobos gigantes os caçaram. Não vão importunar
ninguém por uns tempos.
- Mas eles não
nos caçam !
- Eles são como todo animal que come carne, filho. Quem
caca e tem fome, mata qualquer coisa. Pelo menos o outro tipo de urso, o Urso
Gigante, e’ assim.
- Mas ele não e’ considerados um Deus mau !
- Não, por sua raridade. Só’ e’ ma’ a Morte de dentes Longos, que e’ bem mais
comum. Chega de falar disto. Amanha você conversara’ com o Xaman a respeito.
Xer- Norsman deitou-se na colcha de pele de urso,
sangrenta, gordurosa e terrivelmente mal cheirosa, e pôs-se a dormir, não sem
antes ficar observando por alguns minutos as sombras bruxuleantes refletidas na
parede da caverna a luz da fogueira. O tempo passou, e a madrugada estava quase
no fim, faltando uma hora para
amanhecer, quando se ouviu ao longe o trombetear dos Mamutes ao longe. O menino
acordou assustado, mas logo identificou os urros.
Ele era fascinado pelos Mamutes. O tamanho deles o
impressionava desde criança.
Mas como era muito jovem ainda para caçar Mamutes, seu
pai não o deixava ir as cacadas, e ele só os via depois de mortos, e ajudava a
descarna-los.
Aquela madrugada, decidiu-se por ir espia-los. Queria
vê-los vivos, e de perto. Sabia que não podia acordar ninguém, pois era sabido
já de muito tempo, que onde existissem Mamutes, existiriam Mortes de Dentes
Longos, Ursos gigantes e Lobos gigantes e seu pai e o restante de seu povo o
impediria de passar por esta aventura perigosa.
Levantou-se com cuidado, pegou a lança de caçar Mamutes de
seu pai, e saiu da caverna ,já vestido com peles de...Mamute.
O frio estava congelante, o vento uivante acoitava-lhe a
pele, a escuridão começava a se desvanecer agora.
Sabia que sua aventura
implicava em riscos de morte muito sérios, mas estava decidido a
arriscar tudo para ver estas criaturas gigantescas.
Ouviu o uivo dos lobos gigantes ao longe, sentiu o
cheiro de predadores pequenos por perto,
desviou-se do caminho deles, passou pelo lago congelado e pelas caveiras de
cavalo horripilantes acima da superfície do lago, e, refeito do susto, quando a
floresta acabou, ouviu os rugidos dos grandes elefantes peludos que procurava,
já de perto. Escondeu-se atras de uma arvore e viu: lá estavam eles, gloriosos
em sua majestade, os Mamutes. Podia-se contar uns vinte deles, e alguns
filhotes. Estava simplesmente deslumbrado. Ele notou no entanto que
repentinamente eles ficaram nervosos.
Pensando que eles o tivessem farejado, sentiu o vento, e
percebeu que ele não era a causa daquela agitação.
(por continuar)
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