quarta-feira, 18 de setembro de 2024

Conto: As Tormentas do Barão

 

As tormentas do Barão

 

Os vizinhos daquela lúgubre mansão já não suportavam mais a presença do dono dela.

O Barão de Luchechenko, que ali morava, era mal afamado na cidade.

Ninguém sabia qual a sua idade exata, só sabiam que ele era idoso.

Sempre era visto na cidade com seu fraque e cartola, seu cachimbo, e sua ojeriza a ter contato com as pessoas, falava só o necessário, quando necessário, apenas com quem fosse necessário.

Sua cartola enterrada na cabeça jogada para a frente não deixava que as pessoas vissem seu olhar, e sua expressão era sempre séria, em um semblante que parecia esconder muitos segredos amargos.

Mas de sua vida, ninguém sabia.

Empregados na mansão viviam mudando, ele os despdedia com facilidade.

Era absolutamente solitário, e pouco saia de casa.

Não ligava para  a moda, incluso que cartola já tinha caído em desuso faz tempo, assim como sua limousine Voisin do começo do século, que ninguém mais usava fazia eras.

Usava ainda relógio de bolso, com sua típica corrente de ouro, quando há muito todos já usavam relógio de pulso.

Sua mansão tinha luz elétrica, mas ele pouco a usava, gostava de viver como no século XIX, com suas velas predominando, e mesmo suas lâmpadas elétricas eram fracas, então a mansão estava sempre mergulhada na escuridão, sob os desígnios das trevas oscuras.

Todos os seus móveis, em estilo de meados do século XIX inham cores escuras e tons apagados.

Quando dentro  de casa, ele trocava o fraque por um roupão  de cetim espesso e pesado, a ponto de rebaixar seus ombros, que já tinham se acostumado e parado naquela posição.

Pantufas de lá de coelho lhe cobriam os pés , já escondidos por grossas meias.

Seu roupão tinha uma estampa enigmática, com pequenos seres infernais em diversas posições beliciosas e  agressivas.

O cachecol encarquilhado, sempre o mesmo, lhe cobria a papada e as rugas, já que a obesidade de seu corpo era o encardido e antiquíssimo roupão que escondia.

As janelas, mesmo quando abertas, tinham pesadas cortinas de um tom de vermelho quase marrom, e as que ddavam para a rua eram sempre fechadas.

No qwuintal malcuidado, um pequeno morro com uma tétrica forca.

Não á toa, as pessoas tinham medo de ir visita-lo.

Mas o Barão não tinha aanimais de estimação, e na garagem, junto ao antiquíssimo Voisin, uma velha carruagem jazia com dois esqueletos de cavalos  montados em posição de puxá-la, sustentados por uma armação metálica.

Até seus motoristas particulares tinham medo de tirar o carro de lá, especialmente a noite.

Embora a mansão fosse habitada, tinha fama de malduita e mal-assombrada.

Numa noite de Outono, o barão sentado ‘a sua poltrona de couro no estilo capitonée marrom bem escura,que diziam as más línguas seria revestida do couro dos cavalos da carruagem, ao lado de uma janela, fumava seu cachimbo, com sua velha bengala com uma miniatura de crânio de bode   esculpida em prata escurecida ao seu lado.Na mesinha redonda ao lado, como de hábito, a velha taça de vodka que adorava.

Lia um livro que não tinha nada escrito na capa, nem tinha qualquer gravura nela também, sem revelar título ou autor.

Ele lia aquele livro há anos, mas quanto mais lia, mais páginas o livro parecia ter no dia seguinte, e o marcador acada dia estava mais para o c0omeço do que para o fim.

Acabou sua bebida, e o Barão se levantou com certa dificuldade.

Foi quando algo muito estranho começou a lhe acontecer.

Ao levanta-se, viu sua própria sombra.

Por algum motivo, ela o incomodava.

Então usou de sua bengala e fez com ela um movimento no chão como se a quisesse afar de si.

Para sua surpresa, parte da sombra recuou, e mostrou outra sombra debaixo dela:

Era a sombra de um menino, que parecia correr sem sair do lugar.

Espantado, o Barão olhou para a pequena sombra atrás da sombra, e ela pareceu então ensaiar um sorriso sinistro !

Assustado, aquilo o Barão não conseguia entender, mas o que viria logo depois lhe fez deixar cair a taça de cristal no chão, com estardalhaço:

A Sombra do menino tinha olhos !

Que se abriram!

E o menino apontou para ele e riu.

Uma risada de início infantil, mas que depois soou tétrica, tenebrosa !

O Barão arregalhou os olhos e se arrepiou todo!

Que raios seria aquilo, seria o efeito da vodka?

Mas todos os dias ele tomava sempre a mesma quantidade e nunca ficava bêbado.

Ele decidiu caminhar pela casa, mas o menino parecia o perseguir por trás de cada sobra, e por vezes, projetava-se nas paredes e teto, parecendo gigantesca.

O Barão já não tinha mais idade para correr, mas o rictus do pavor estava em seu rosto contorcido e convulso.

Como usava a bendita cartola até dentro de casa, o dia todo, tentou enterrá-la mais fundo para a frente, tentando cobrir mais o rosto, mas não adiuantava.

As sombras de tudo pareciam perseguir, sempre lideradas pelo menino- seria seu passado, o menino que um dia fora, tentando lhe chamar a atenção?

Ele não o sabia, nem mesmo ele sabia, não havia como explicar aquilo, mas a sombra do menino sorrindo e gargalhando, com um olhar cruel e uma risada de vilão , o seguia pela casa, dançando em volta dele.

O que queria aquela sub-sombra de menino , dele?

Foi quando ele olhou pela janela da sala de jantar e sua enorme mesa e suas cadeiras de espaldar alto revestidas de veludo cor de vinho, e viu um pequeno ser entrar pela janela.

-Ah, é um gato !Agora sei por que nunca há ratos aqui !

Disse o Barão, com seu grave vozeirão trovejante.

O gato, inteiramente preto, entrou na casa, subiu na mesa e o fitou nos olhos.

Imediatamente o Barão teve a severa sensação de que estava sendo julgado e condenado!

O que ele fizera em seu passado, quando menino ou mais velho, em que uma sombra de um menino pareciam forar seu júri?

Ele tentou desviar o olhar do gato, mas não conseguia.

Foi quando olhou a sombra do menino agradar o gato. Que lhe correspondeu aos afagos como se o menino fosse vivo, fosse um ente vivente e existente.

Consternado, se aproximou do gato para tentar agradá-lo também, e a sombra do menino sumiu.

Ao chegar perto do gato, a sombra deste cresceu e se projetou como a sombra de um tigre siberiano-e esta sobra lhe arreganhou os dentes, embora o gato estivesse a se limpar calmamente, se lambendo todo.

A sombra do tigre saída do gato abriu seus olhos num olhar feroz e o rugido ressoou pela casa com um trovão !

Recuou o Barão, amedrontado, completamente alucinado, e olhou para baixo e viu a caveira de bode da sua bengala se animar em um sorriso sinistro, e ele a deixou cair no chão, e ela virou a sombra de uma serpernte.

Por demais que da vida fosse ele tão experiente, nunca vira nada igual !

Resolveu voltar o mais rápido que poia para sua poltrona, e ao sentar-se, viu sua própria sombra a abrir-se , o menino voltar para dentro dele, e ela a  fechar-se. E sozinha!

O gato reluzente em seu pelo preto e resplandescente, estava com um rato na boca e o ofereceu a ele.

O Barão tentou soltar um grito, há muito preso na garganta, mas que ressoou no mais completo e agônico silêncio.

No dia seguinte, quando os empregados chegaram, a moça viu o Barão sentado.

Estava morto, seco, apenas seu esqueleto ali jazia, como se há décadas tivesse morrido.

O gato preto por ali estava, a devorar ratos que encontrara.

Quando não tinha mais ninguém por perto, já á noite, o Barão tinha se transformado em sua própria sombra, a correr do menino, do gato e do tigre- para sempre !

 

                                 FIM

 

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Conto: O Leopardo e a borboleta

 

O O Leopardo e a Borboleta

 

Em um raro momento de descanso, ali na Africa , á beira de um riacho, um remanso,

Um jovem Leopardo desceu de sua alta árvore para a relva, pois ocasiões sem perigos na selva quase não haviam.

Ele estava de ventre cheio pois a gazela que caçara ele já a tinha devorado.

Ali da savana era o seio, em algum lugar da Africa, ali no meio, ele agora podia descer sem rodeio.

Já ia longe a estação das chuvas e aquele regato fora o que sobrara de um riacho, que diacho !

Era no momento pequeno demais para sustentar um crocodilo,então ficar na margem agora era sensato.

Os leões , pelo leopardo tão temidos, estavam longe, preguiçosamente dormindo, e as Hienas, também distantes, tratavam de seus negócios,periclitantes.

Sem ter o temor como fardo, o ágil e elástico Leopardo, agora sentara na beira do regado , a admirar a paisagem , pensativo.

Foi quando viu uma bordoleta em seu voo errático, e ele a fitou com seu olhar enigmático.

Quem, no entanto pudesse lhe explorar seu olhar com mais vagar,viria no brilho daqueles olhos enorme um certo encanto.

Não era um olhar nem de ferocidade nem de pranto.

A bocarra semi aberta deixava entrever-lhe os dentes temíveis,o focinho sempre úmido e brilhante luzia radiante os raios do sol inclemente africano, havia um quê de poesia naquele momento precioso, tanto que aquele olhar felino parecia dadivoso,aquele jogo de luz e sombra que brincava com a visão, tudo ali marecia um momento congelado de arte, parado no tempo por um fugaz momento,e o Leopardo eis que sonhava !

Seria um sonho de voar?

Onde já se viu um leopardo voador?

Aqueles olhos profundos revelavam auto confiança sem temor,contemplação, quem sabe amor?

A delicadeza daqueles olhos que se moveram para mirar, quando a delicada borboleta em seu focinho ousou pousar,

Era a mesma com a qual o destemido felino a observava, entre sonhos e desvairios, sem os temores sombrios de predadores maiores e implacáveis, a paz e a tranquilidade que reinava  fazia parte daquela mágica, aquele momento de arte,breves momentos estáveis, de resto fora daquele interim, inimagináveis.

Para o Leopardo, aqueles poucos minutos em que permanecera sentado, contemplativo em diáfanas ilusões, desta vez não seriam rasgados brutalmente pelos leões.

Ele olhava cismado, os movimentos daquelas pequenas asas delicadas, batendo devagar, descompensadas, e aquele caos descoordenado para ela era de uma beleza inenarrável, que nunca antes percebera,imperfeição que perfazia a perfeição inimaginável.

Se o Leopardo, voar não podia,ao menos expressar sua alegria  de viver aquele momento tão precioso ele iria!

Eis que pois, a borboleta decola e levanta voo.

O ágil felino corre atrás dela ao sol do quase anoitecer, e quer voar , dá um salto, por alguns segundos mira o Mundo a dois metros de altura, havia em seu olhar encantamento e candura, com aquele raro momento de liberdade e voo.

A borboleta vai embora e o Leopardo cai nas quatro patas, imávido e resoluto.

Era hora, era hora, o momento absoluto!

Ele corre e salta, e sobe na árvore com maestria, até os galhos em que os leões são incapazes de alcançar, para então em segurança dormir e sonhar.

Com aquele fugaz momento, que fazia agora parte da sua memória, de sua vida sua história, aquele momento de liberdade e vitória, em toda a sua glória.

Na África, o sol agora desaparecia, e o manto negro do firmamento descia, cobrindo a verde paisagem com suas estrelas.

Ali, em meio á aquela imensidão, um solitário  Leopardo adormecia e sonhava,sem que saibamos qual seria seu pensamento, mas feliz, feliz, enquanto podia, instantes fugazes de ternura, candura e alegria, mal se divisava da copa da árvore abaixo da lua cheia, com todo encanto que da Natureza emana e permeia !                   

 

                                  FIM