Episodio
6 : O Dilema e a Fera
Mitthu
acordou ao raiar do dia. Mais um dia para viver, mais um dia para fugir, mais
um dia para sofrer, mais um dia para continuar o que aos poucos ocorre desde
que se nasce : morrer.
Quando
Mitthu abriu seus olhos,no entanto,notou que não estava mais na escuridão da
Floresta, mas em um Vale,
próximo da mata em que tinha se embrenhado anteriormente.
Podia
ouvir o som das águas límpidas de um Rio, e as bestas voadoras a gritarem entre
as Montanhas que cercavam o vale.
O
vento da manha acoitava sua pele,lanhava seu animo e congelava sua motivação.
Foi
então que percebeu uma sombra aproximando-se dele.Não era uma sombra qualquer,
era gigantesca, e a insegurança que
Mitthu sentia a tornava ainda maior.Ele logo encolheu-se em posição fetal.
-E´esta
a coragem e a nobreza de coração dos
Soldados do Imperador de que tanto ouvi
falar?
A
voz vinha da sombra, e para Mitthu, mortificado de pavor,parecia trovejante e
assustadora.Engolindo em seco, o soldado respondeu timidamente:
-Quem
e´você?
-Trata-se
de uma excelente questão esta que você levantou.Alguns me chamam de Besta Fera, outros de Monstro do Vale,outros
ainda já me chamaram de Morte.Nenhum deles sobreviveu,por isto e´que todos que
aqui chegam jamais retornaram.Eu mesma prefiro
me chamar Voihuu,a Predadora.
-Estou
então no Vale da Fera! Então, estou mesmo morto !
-Ainda
não. Eu o encontrei caído na floresta vizinha ao vale, e o resgatei de la, para
que as outras feras não o devorassem.
-Entao,você
salvou minha vida! Porque?
-Por
que sou cruel, meu caro soldado.Mas, eu te pergunto: terei eu salvo mesmo a sua
vida?
Mitthu
tinha no rosto a pura expressão da angustia, de não so´entender o que ela
dizia,como também não saber o que responder.
O
vento gelado soprava com forca , ondulando a densa pelagem de Voihuu.
O
Sol aparecia ainda timido , a lua branca ainda podia ser vista, em contraste com o
espetáculo de cores que se descortinava
para eles, e o brilho dos raios solares que inundavam as campinas de relva
verdejante que oscilavam qual maré,sob o efeito do vento cortante como faca,
que castigava a pele nua do torso de Mitthu,com seu rosto contorcido de agonia.
O
soldado então ergueu a cabeça e la estava a Fera, bem próxima:ela alcançava
três vezes a altura de um homem médio,era humanóide,ficando de pe´nas patas
traseiras, que lembram muito a dos ursos,mas as dianteiras lembravam mais as de um gorila.A cabeça
lembrava a de um felino, e os caninos em forma de sabre ,com cerca de quarenta
centímetros de comprimento, saiam para fora da boca.As orelhas, no entanto
lembravam mais as de um elefante, mas proporcionalmente menores.Os olhos eram
grandes e verdes, e brilhavam como esmeraldas, em contraste com a pelagem de um azul bastante escuro.A cauda
era fina e serpenteante, longa, e lembrava
a de um grande felino.No entanto, o torso se afinava a meio caminho entre as omoplatas e a bacia,
como nas mulheres, e como nelas, seios grandes e redondos, muito peludos, com
exceção dos mamilos rosados e grandes.
Na
região pubiana os pelos se tornavam ainda mais densos e bem negros.
Da
cabeça, e entre as orelhas, uma cabeleira negra , lisa e sedosa descia ate´as
nádegas, que eram de proporções generosas.
Tanto
as mãos , como os pés, terminavam em garras muito compridas e afiadas, mas
estas eram semi retrateis, e se recolhiam parcialmente para dentro, quando não
estavam em uso.Sendo assim, quando recolhidas, pareciam muito menores e
temíveis.
Os
dentes eram especializados em dieta carnívora,e todos eles, assim como a
própria cabeça em si, eram grandes e volumosos, tanto quanto os músculos de
mastigação e o cérebro, com aproximadamente o mesmo tamanho e complexidade do
humano.
A
musculatura era pelo menos duas vezes mais poderosa do que a de um Urso
polar.As pernas, no entanto, ficavam constantemente meio dobradas, acumulando
energia, e ainda que o andar fosse desajeitado,ela podia correr muito , tanto
em duas como em quatro patas,e saltar com grande agilidade, apesar de suas duas
toneladas de peso.
Voihuu
então sorriu um sorriso tétrico, com um que de autoconfiança e uma segurança
sinistra.Todos os dentes estavam ali, a mostra,enormes,prontos para estraçalhar
o que bem entendesse.
-Você
não me parece muito autoconfiante, meu caro. Como você se chama?
-Mitt...Mitthu!
-Huuum,
então este era seu nome.Espero que você tenha aproveitado bem sua vida, Mitthu,
pois esta a ponto de perdê-la.
As
garras das mãos da fera saltaram para fora.
-Espere!
Por que quer me devorar? Se assim o quer, porque me poupou ate´agora?
-Salvei
sua vida para depois tira-la, pois sou cruel.Na verdade, não estou com fome
agora, mas estou com vontade de matar.
-E
qual o sentido de matar?
-E
qual o sentido de viver,Mitthu?
-Não
há´sentido em viver,se a morte se inicia com o nascer.Mas não há sentido em
morrer, também.Por que nada pode ser eterno?Porque tudo e´cíclico?
-E´um
ciclo virtuoso ou vicioso? Já me perguntei muito a este respeito também,
Mitthu, e nunca achei a resposta. Mas , gostei de você.Você e´inteligente.
Então lhe digo que nada pode ser eterno,mas no fundo, justamente tudo
e´eterno.Eternidade e´uma repetição de ciclos de modo interminável,tudo começa
onde tudo termina.O Porque disto para mim e´um mistério.
-Um
mistério e´um dilema a ser descoberto ou
que não tem solução, Voihuu?
-Eis
outro ciclo! Um mistério e´um dilema porque ainda não foi descoberto e ainda
não foi descoberto porque ainda não se achou a solução.Mas que pobreza de
raciocínio a humana, achar que tudo pode ser descoberto ou solucionado.O que
apavora o Homem e´a falta de solução. Para vocês, o aterrador e´constatar que
para certos mistérios simplesmente não existe solução alguma, e a inexistência
de soluções e´a própria solução do mistério.Ele existe por si mesmo, não para o
Homem.Tudo existe porque existe, não para ser entendido.
-Isto
e´natural, como os demais fenômenos naturais, os instintos?
-O
que e´ser Natural para você? Considerar que tudo o que não seja humano nem
fabricado pelo homem e´natural, e´ser presunçoso.Tudo e´natural. E por falar em
instinto, saiba que sou a ultima da minha espécie.Então, e´hora de um outro
instinto, que me leva a poupar sua vida
mais uma vez,ao menos por enquanto: a reprodução.
-Mas
somos de espécies diferentes!
-Diferentes
em espécie e gênero, mas iguais em instinto.E depois, quem disse que quero ter
filhotes? Afinal, ser cruel também e´fazer sofrer! E porque não explorar a
ambigüidade humana, dor e prazer?Enfim, e´uma ordem!
(Por Continuar)
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