Enquanto
isto, sem cabeça para trabalhar, Takeo sofria.
Ele
ainda não entendia o comportamento de Lune e as razões pelas quais ela se
movia, que a levavam a se comportar assim.
O
trauma era intenso, o sentimento de rejeição e a mágoa convulsionavam em sua mente em ondas!
A
tendência dele, tipicamente masculina, era a de achar que ele não fizera nada
de errado-mas ele sabia que fizera!
E
ele sabia o que fizera de errado, mas o que estava duro de acetar era que o que
fizera, e lhe parecia tão natural, era errado.
Claro,
naquele momento ele não estava se colocando no lugar de Lune, ou não estava
querendo?
Eis
que pois , se colocar no lugar dela agora seria para ele muito doloroso, uma
dor que ele não queria enfrentar, da qual queria se poupar; culpa, culpa,
culpa,aquilo lhe atormentava assaz ferozmente e não o deixava pensar!
Medo,
medo, medo da consequências, ela está grávida, sua consciência lhe lembrava !
Ele
fora condicionado a vida toda a não mostrar medo, não mostrar insegurança
diante das mulheres, sobretudo; mas diante da poderosa Lune ele se via
fracassando miseravelmente !
Seu
Ditador Interior bradava na sua Mente:-Incompeteente !
Seu
Juiz Interior em sua Mente urrava simplesmente:-Falho !
E
mais e mais Takeo se deprimia, e abraçava o travesseiro, deito encolhido em posição fetal na cama, e o cheiro
de Lune nos lençóis o enlouqueciam, pareciam censurá-lo e reprova-lo e seu
rosto se cobria de vergonha em meio a um turbilhão de lágrimas.
Cadê
aquele homem tão seguro de si?
Ele
bem tentava fechar os olhos e dormir, mas não conseguia.
Seus
olhos se reviravam em agonia e refletiam sua angústia acompanhando o corpo que
virava de um lado a outro, mas ele não a esquecia!
Ele
começou a se lembrar do tempoem que todas o recusavam. E depois, do tempo em
que tentava conquistar Lune e todas as vezes que ela o recusou, e o quanto ela
demorou para aceita-lo.
Mas...
ele a conquisto, oras !Foi tão difícil, levou tanto tempo, requeriu tanto
esforço, mas ele conseguira afinal, e ele iria por tudo a perder?
Não,
ele não poderia, ele pensava consigo mesmo, ele não poderia. Custara tanto,
foram tantos sacrifícios, fora tanto que sofrera, tantos traumas e rejeições
que sofrera...mas ele ainda estava pensando em si, não nela.
Desolado
e deprimido, confuso, finalmente se
levantou da cama.Eram mais de dez da manhã agora, e subitamente, seu celular
tocou:
-
Alô?Takeo-san?
Os
olhos dele se arregalaram: era Kazuo !
-Eeeee...
-O
que está fazendo em casa, Takeo-san?Por que não veio trabalhar até agora?
Bateu
o desespero nele: o que diria a seu chefe e sogro?
Instintivamente,
sem perceber, começou a soluçar e chorar.
Agora
foi a vez de Kazuo se espantar.
-Ei,
ei, o que está acontecendo?
Takeo
suspirou fundo, armou-se de coragem, diante da necessidade imperiosa de se
abrir com alguém , e contou tudo o que acontecera , em detalhes, chegando mesmo
a esquecer que estava relatando a um pai algo que os pais não querem saber das
filhas.
Ainda
assim, Kazuo foi paciente, e escutou tudo até o fim, prestando especial atenção
a como Takeo se sentia.
E
não tardou a responder, percebendo a franqueza e sinceridade nas palavras de
Takeo.
-Olha,
eu não sou exatamente a pessoa mais indicada para ouvir o que você disse e te
ajudar, mas você é o marido de minha filha então, por ela, tentarei assim
mesmo.Eu compreendo perfeitamente o que você sentiu, e sente, o que você está
passando, pois já passei por isto em meu casamento.E resolvi esta situação. Mas
não posso te dar a minha própria solução por que somos muito diferentes e Lune
não é a Momiji.Elas também são muito diferentes, embora sejam muito parecidas
em muitas coisas.Você terá de encontrar a sua própria. Eu não tenho como saber
como minha filha está se sentindo agora após isto, mas posso tentar me colocar
no lugar dela também, como tentei com Momiji.E posso te dizer, pelo muito que
conheço de minha filha, que ela não está fazendo na cabeça dela um terço do
drama que você pensa que ela está sentindo.Ela amadureceu muito, e nisto
você a ajudou muito.Acho que a intenção
dela com este comportamento é justamente te forçar a se colocar no lugar dela e
crescer e amadurecer como pessoa humana, se desconstruir e ser menos
machista.Perceber que o que lhe parece muito natural na verdade não é nada
natural. Sabe, Takeo-san, muitas coisas parecem naturais, mais não são. E
outras parecem não serem naturais e são.Aprender a distinguir estas nuances não
é fácil, muito menos indolor.Há que se lembrar
da relatividade das coisas, e sendo assim, o que nos parece natural, não
é para outras pessoas.Mas, se quisermos nos colocar no lugar de outra pessoa,
não podemos fazer isto de maneira egoísta, narcisita, egocêntrica:não adianta
nos colocarmos no lugar da outra pessoa usando nossos próprios sentimentos, o
como nós nos sentimos e pensar como nos sentiríamos no lugar da outra, pois nós
somos muito diferentes das outras pessoas, as outras pessoas não tem os nossos
sentimentos. É preciso, baseado no comportamento que já observamos da outra
pessoa, suas reações, o que ela já externou de como pensa,se colocar no lugar
da outra pessoa imaginando,diria até, tentando adivinhar, como ela se se sentiria naquela situação.Se é
um método sujeito a falhas e erros?Sim, claro que é, e muito ! Mas erra-se
muito menos do que se colocar no lugar
da pessoa com a mentalidade de “se eu fosse você, faria isto, isto e aquilo”.
Veja, Takeo-san, este “se eu fosse você” é ego, não empatia. Não verdadeira
Teoria da Mente. Não é se colocar de verdade no colocar da pessoa. Imaginar
como a outra pessoa se sente em determinada situação é muito diferente do que
colocar a si mesmo na mesma situação, percebe a diferença?O seu grande drama
está aí, você está se colocando a si mesmo, e não a ela, no lugar dela. Mas ela
é muito diferente de você, apesar de vocês dois terem em comum o fato de serem
Autistas. Mas os Autismos de vocês são muito diferentes entre si, e não dá para
querer comparar.São sim, parecidos em muitas coisas, mas cada um de um jeito
diferente, e tem muitas diferenças também...
(Por Continuar)
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