-Damian, eu gostaria que você por favor
explicasse com mais detalhes seu raciocínio, por favor.
-Para esperarmos uma atitude ou uma resposta de
alguém, é preciso que nós a possamos prever. Se tal resposta for impossível de
prever, só pode ser impossível de se esperar. Só podemos esperar o que já
previmos. Afinal, se previmos, planejamos, e algo que não se espera é algo que
não fora planejado, e se não foi planejado, como pode ser esperado?
-Bastante lógico , Damian, mas a surpresa, por
exemplo, não pode ser planejada nem prevista por quem a recebe, somente por
quem a causa.
-A Surpresa de fato é um ato planejado, com uma
reação de susto prevista e esperada. Se a pessoa que receber a surpresa, porém
não se assustar, e ficar brava, esta será uma reação inesperada.
-Não seria também imprevisível, Damian?
-Não. Quem planeja a Surpresa precisa contar
com a possibilidade de a outra pessoa ter outras reações diversas da planejada
para ela ter. Não é impossível que ocorra uma situação de resposta diferente de um susto, então precisamos
contar com a possibilidade dela ocorrer também.
-Mas, Damian, o susto seria de longe a reação
com maiores chances de acontecer, as outras possibilidades são ínfimas, por que
seriam levadas em conta?
-Esta é a diferença entre o meu tipo de
raciocínio e o seu. Eu já penso que não é por que uma reação é a mais esperada,
que as demais devem ser desprezadas como ínfimas e não devem entrar no
planejamento. Para mim, todas as possibilidades tem possibilidade de ocorrer, e
se tiver um por cento de chance, pode acontecer, então tudo deve ser
contabilizado e se contar com todas as respostas possíveis, e todas elas devem
entrar no planejamento, sem exceção. Assim, nunca se será pego de surpresa e se
estará preparado para todas as situações possíveis !
-Ah, Damian, mas aí perde a graça...qual a
graça da vida sem surpresas? Se tudo ficar previsível e planejável, não fica um
negócio chato?
-Mais uma diferença entre nossos raciocínios e
lógicas. Eu vejo uma grande harmonia e beleza no Planejamento Absoluto, que
você não consegue enxergar. É como uma sinfonia, uma arte musical em que tudo é
planejado, previsto, arquitetado, construído como um sistema autocontido, que
funciona harmonicamente, numa cadeia de reações e ações perfeitas, e o
resultado é majestoso e belo, influindo inclusive no emocional, é um exemplo
onde o perfeitamente racional pode levar ao êxtase emocional.
Adora ficou muda. Ele tinha razão, ele
conseguia ver beleza onde ela só via aridez, e mostrava que nem tudo que é
exaustivamente planejado, projetado e sem surpresas é feio e/ou chato, pode ser
belo e maravilhar os sentidos, o coração, a alma. Para aquele rapaz, as letras
e números eis que tinham alma, e podiam perfazer um coração, mostrar emoções
que nem todo mundo conseguiria ver ou perceber, mas que existiam, para quem
neles prestasse atenção, desse uma chance e visse com os olhos do coração !
Adora estava a ponto de chorar de emoção, mas
viu que era a hora do intervalo, e não demorou, Damian pegou na mão dela e a
conduziu meio atropeladamente para o
quintal, para lhe mostrar o progresso do Girassol.
Naquela noite, Adora foi dormir feliz com
sucesso que estava obtendoe os progressos conquistados, mas acho que ela
deveria continuar com estes diálogos por mais tempo, até ele se acostumar e
falar passar a ser algo automático, um hábito.
Um mês depois, as conversas fluíam naturalmente
e Damian já falava não apenas
fluentemente, mas bastante ‘a vontade. Tinha aposentado os papéis e o
gravadorzinho.
Um belo dia Damian acordou e viu sua mãe na
cozinha, preparando o café da manhã.
A voz dele soou alta e clara:
-Bom dia, mãe ! Dormiu bem?
Madeleine se arrepiou que nem gato assustado,
arregalou os olhos, seu queixo caiu e ela cambaleou, prestes a desmaiar!
Damian correu a ampará-la e a segurou.
Ela abriu os olhos e estes estavam rasos de
lágrimas, que escorriam abundantes. Ela o abraçou com uma força que nem ela
mesma acreditava que tinha!
-O que aconteceu, mãe? Por que desmaiou? Por
que você está chorando? Fiz alguma coisa de errado?
-Filho, meu filho, me diz que não estou
sonhando, por favor...
-A senhora não está sonhando.
-Eu não acredito...não acredito...você nunca me
deu bom dia, você está conversando comigo...naturalmente...é um milagre, só
pode ser...
-Eu não menti quando disse que a senhora não
está sonhando ! Não sou mentiroso !
-Claro que não é, filho, é só modo de
dizer...eu estou chorando de alegria...tenho meu sonho realizado, eu mal
consigo acreditar...me belisca, eu quero ter certeza!
Damian prontamente atendeu o pedido da mãe e a
beliscou no braço.
-Aaaai !Era só modo de falar outra vez...
-A senhora que pediu...
Aquele fora um dos dias mais felizes da vida de
Madeleine, e ela foi trabalhar com um largo sorriso no rosto. Ligou para Adora
e a agradeceu até não poder mais e várias vezes chorou ao telefone, tamanha era
sua alegria, que nem lhe cabia no coração !
A educação de Damian agora se concentrava mais
nos estudos escolares e ele agora parecia aprender cada vez mais depressa ao
mesmo tempo que parecia amadurecer emocionalmente e adquirir mais malícia. Finalmente,
Adora concluiu que ele já tinha alcançado o conteúdo do sexto ano e já podia,
depois de tanto tempo passado, voltar para a escola. Durante todo o aprendizado
dele, Adora procurou escolas pela cidade até que finalmente achou uma que
aceitasse Autistas. Para prevenir quebra de rotina, Adora levava-o para visitar
o seu futuro colégio, o deixava explorá-lo em todos os cantos e detalhes e lhe
apresentou colegas, tanto garotos como garotas. Durante este período
preparatório, ela conversou com os futuros colegas de classe dele e os preparou
psicologicamente e os conscientizou para respeitarem as diferenças e os ensinou
a lidarem corretamente com ele nas situações mais comuns.
Finalmente, depois de tudo preparado, ela se
transferiu para o novo colégio dele, e no primeiro dia de aula, Adora e
Madeleine foram com ele ao colégio. Também Jeanne ficou sabendo de tudo e
correu a se matricular no mesmo colégio e mesma classe de Damian. E como foi o
primeiro dia de aula de Damian na nova escola?
(Por continuar)
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