A Manifestação
Finalmente estava
tudo pronto para a Manifestação.
Glória comandava as massas e sua pele de tom
caramelo escuro brilhava ao sol. Seus cabelos encaracolados pouco balançavam
com o vento, mas o olhar daqueles olhos de um negro profundo era determinado,
decidido. De seus lábios espessos e curvilíneos se ouviu:
-Avançar !
Aquele corpo magro e alto parecia tão leve e lépido, mas
transmitia tanta confiança e fortaleza, com seus movimentos graciosos , mas intensamente resolutos, que
pareciam encantar a multidão.
De um lado, ficava o Parlamento, de outro, uma fila
de prédios dos Ministérios, ‘a frente, o
Palácio Presidencial.
Pela manifestação aguardavam milhares de
policiais da tropa de choque, cães, e a Cavalaria também ali estava, com
centenas de equinos de duas e quatro pernas. Helicópteros da Polícia e da principal
rede de televisão sobrevoavam o palco da revolta.
Centenas e centenas de carros de polícia também
estavam presentes.
Dentro dos prédios, políticos votavam Leis anti
povo e Lesa Pátria. Outros, estavam reunidos em negociatas escusas e obscuras,
conspirando contra seu próprio povo, planejando golpes perversos. Mais abaixo,
no prédio da Suprema Coorte do País, supremos juízes confabulavam julgando
causas em favor das Elites e tomando decisões que eram uma verdadeira traição ‘a
Democracia, Estado de Direito e estupravam violentamente a Constituição, sem dó
nem piedade.
E eis que a multidão chegou. Contavam-se em um
milhão, e tomaram toda a praça central entre os prédios oficiais.
Chegaram rufando suas palavras de ordem, de peito
aberto, corajosamente, mulheres e homens.
Bastou a aproximação e os policiais se inquietaram, vendo a imensa multidão se espalhar pela praça.
Centenas de milhares começaram a fazer uma
movimentação de cerco ao Parlamento, e os policiais responderam com bombas de
gás lacrimogênio e de efeito moral, mas apesar de muitos serem atingidos, o
grosso continuou avançando, pois estas armas eram eficazes contra pequenas
multidões, mas não alcançavam os que estavam na retaguarda, que iam
substituindo os da vanguarda.
A horda de policiais apelou para os cassetetes e
bala as balas de borracha, com seus fuzis.
Mas a proporção era de cem para um a favor dos
manifestantes e eles continuavam avançando, embora muitos apanhassem
brutalmente.
Mais bombas e a cavalaria entrou em ação, mas a
multidão compactou-se, e começaram a se comprimir junto as pernas dos cavalos,
sem dar espaço para que eles os pisoteassem. No início, durante a aproximação,
no entanto, ao menos um milhar fora violentamente pisoteado e já se registravam
centenas de mortes.
Mas a onda humana continuava avançando e o cerco
humano ao Parlamento se fechou e completou.
Os manifestantes liderados pela valente moça
chamada Glória, continuou avançando e agora comprimiam os policiais junto ‘as
paredes do prédio, e por mais que estes batessem e jogassem bombas, não
conseguiam atingir a todos.
Do alto dos prédios mais próximos, diversos
manifestantes com binóculos potentes avisavam Glória e os cabeças da
Menifestação dos movimentos da Polícia, e ela manobrava os manifestantes como
um General o faz com seu exército, com táticas e estratégias bem planejadas,
afinal, a Manifestação tinha sido meticulosamente planejada por meses.
Acuados, e espremidos contra os prédios e uns
contra os outros, os policiais iam sendo esmagados pelo peso da massa popular.
Como previsto, eles solicitaram reforços e estes,
ao chegar, tentaram cercar os manifestantes.
Mas aí veio a surpresa que os policiais não esperavam:
mal eles começaram a repressão, chegou mais um milhão de manifestantes e os
cercaram.
Então parte dos manifestantes originais marcharam
para cima dos novos policiais, e os novos manifestantes também, comprimindo os
policiais em um sanduíche mortal.
O povo simplesmente marchava e deixava que seu
peso em massa em duas direções opostas, em direção aos policiais no meio,
esmagasse os opressores.
Sem espaço mais para usar cassetetes , armas e
bombas, os repressores iam sendo violentamente comprimidos uns contra os outros
esmagando-se uns aos outros, pelo peso da população.
Quando as autoridades se deram conta, todos os
prédios públicos estavam cercados e com as multidões forçando os policiais cada
vez mais para trás. ‘As vezes, se dispersavam um pouco, mas logo voltavam a se
concentrar.
E mais e mais manifestantes iam chegando, de ruas
próximas, e agora eram seis milhões, e as autoridades não tiveram outra
escolha: desesperadas, chamaram o Exército.
Este não demorou a chegar, com seus tanques e
fuzis com balas de verdade, e começou o massacre:
Milhares de balas de chumbo voavam pela praça e
sangue esvoaçava por todo lado. Dentre os manifestantes, os mortos se contavam ‘as
dezenas de milhares.
Carros blindados e tanques atropelavam multidões
e saíam esmagando quem estivesse no caminho.
Mas mesmo diante desta literalmente esmagadora
repressão, os manifestantes continuavam firmes.E mais e mais populares
chegavam.
Agora eram oito milhões, apesar das centenas de
milhares de mortes.
Então chegaram os helicópteros de caça: quatro,
munidos de canhões de trinta milímetros e metralhadoras de nove milímetros,
mais foguetes.
Os helicópteros atiraram na multidão sem dó nem
piedade, com todo o seu poderia, esvaziando toda a sua munição neles.
A praça ficou rubra de sangue, com milhares e
milhares de cadáveres, mas mais e mais gente chegava, e quando a munição se esgotou,
ainda existiam dois milhões, que finalmente conseguiram invadir os prédios e
vencer os policiais e seguranças intrincehirados.
Quinhentos deputados da Direita e cinquenta
senadores da Direita foram linchados até a morte. Igual destino tiveram o
Presidente e o Vice, bem como todos os Ministros do Governo e todos os Ministros
Da Suprema Coorte.
Todos mortos, só restando vivos os Deputados e Senadores de Esquerda.
A rede de televisão, diante da derrota do Governo
e demais Poderes, parou de filmar e foi embora.
Glória, da Tribuna do Parlamento, bradou:
-Vitória !
E em minutos, a praça se esvaziou. Mais milhares
morreram na fuga pelos seus repressores.
Ao todo, cinco milhões de populares jaziam
mortos, cobrindo a praça e arredores dos Palácios e prédios oficiais com um mar
de cadáveres. Todo o gramado e concreto da região estava vermelho de tanto
sangue, verdadeiro mar.
Mas o governo e
a Direita estavam liquidados.
Na televisão, a emissora só lamentou os quinhentos e cinquenta
parlamentares, onze juízes, trinta ministros, Presidente e Vice, mortos.
É como se a população de manifestantes sequer
existisse.
Mas repentinamente, uma horda de manifestantes
invadiu a emissora em plena transmissão do telejornal e mataram os jornalistas,
apresentadores e técnicos.
De surpresa também foi a invasão da mansão dos
donos da emissora, também linchados até a morte.
Já era tarde da noite, e a turba arrefeceu.
Como seria o dia seguinte, ninguém sabia, mas
Glória comemorava com seus e suas camaradas.
Logo chegariam as novas eleições gerais diretas,
mas a Heroína não se candidataria.O futuro ainda iria ser definido, apenas se
sabia que finalmente a Democracia e o Estado de
Direito renasceriam depois da Revolução terminada.
FIM
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