sexta-feira, 3 de abril de 2015

O Presídio- Episódio 58



-Você não tem direito de fazer isto com o meu marido ! Ele tem razão, você  também tem sua parte de culpa em tudo isto, então você fracassou também! Aliás, eu diria mais, o grande e único fracassado aqui é você, que era o único com experiência em Administração e controlava e comandava tudo, e poderia ter mudado o rumo das coisas antes !
-Como você pode falar isto,500800, se você, como ele, ainda não é madura? É verdade que eu era o único experiente, mas todo mundo pode aprender um dia e tem coisas que só se aprende na prática .
-Então por que deixou ele tomar conta da situação e tomar decisões importantes?
-Por que, 500800, vocês estavam numa situação muito cômoda. E precisavam que alguém confiasse em vocês e lhes permitisse realizar seus sonhos. Tudo o que fiz foi para o bem de vocês, as minhas intenções foram as melhores possíveis. Mas na tentativa de acertar, às vezes erramos. Acontece !
-O senhor agora pareceu falar como se fosse pai dele, senhor Diretor.
-Ser o Diretor do Presídio faz com que me sinta um pouco pai de todos mesmo.Mas querem saber ?No fundo o Cidadão 1 tem razão, eu não o consultei para saber as chances que ele julgaria mais adequadas, e dei a ele as chances que eu julguei as mais adequadas para ele, por que eu achava que o conhecia bem, e vejo agora que eu o conhecia apenas vendo pelos meus olhos, não vendo o Mundo pelos olhos dele. É algo que ele foi me ensinando com o tempo, a ver com os olhos dele. É onde posso corrigir meus erros e deixar que ele mesmo aprenda e corrija os dele.Olhem, eu estou velho, cansado...cansado de tantas decisões de tanta autoridade a exercer, esta fantasia social representada pelo meu uniforme. O Homem que vocês conhecem envergando este uniforme não é o verdadeiro homem que sou. Ou talvez seja uma parte. Não sei, sinceramente, não sei. Na verdade não pretendo fazer um sucessor. Pretendo acabar com esta farsa, este teatro social chamado Presídio. No fim, acabei conseguindo, com a ajuda de vocês. Eu precisava parecer autoritário e feroz, temido, para que pudesse me manter no poder e minhas ordens fossem respeitadas.Mas agora, agora quero descansar, é hora do outro homem, que tanto reprimi em mim mesmo emergir e ser quem eu realmente sou, e o que realmente sou certamente vai surpreender todos vocês. Sabem, eu sei como é o menino por trás do 133144. Eu sei bem quem é o verdadeiro 133144, que ele também reprimiu a vida toda. Só que eu não gostaria que ele fosse assim. Não quero que ele repita minha história, meus erros, nem mesmo meus acertos, por que eu quero que ele tenha seus próprios erros e acertos. Reconheço que exigi demais dele, mas ele me mostrou que ele conseguiu, apesar de tudo, corresponder Às minhas expectativas. Mas as minhas não são realmente importante: o que mais me orgulha nele, é que ele foi capaz de cumprir e corresponder às próprias expectativas dele. A verdadeira revolução dele, que ele tanto sonhou na vida dele vai começar agora. E quero muito ver isto acontecer, só assim poderei descansar feliz !
Eu e 500800 ficamos emocionados:estávamos vendo o Diretor como nunca antes,e percebendo que por detrás daquele uniforme medonho, ele, ali sentado diante de nós , com o quepe nas mãos, exibindo seus cabelos brancos, existia outro homem, sensível e humano, confessando suas próprias limitações, mas mostrando por isto mesmo suas qualidades.
Ele se levantou e 500800 o abraçou, e a única coisa que conseguiu falar foi:
-Desculpe...
Ele a abraçou de volta enternecido e lhe deu um beijo na testa. Lágrimas caíam de seus olhos, mas ele se esforçava para não chorar.
Ele me deu um abraço e me disse:
-Muito obrigado por tudo, meu bom amigo !
Ele virou as costas para nós, e deixou cair a pesada capa e o sobretudo, também pesado, e o quepe, assim como as outras duas peças de roupa, também ficou jogado sobre o sofá.
Ele parecia ter um enorme alívio ao tirar aquele uniforme!
Ele começava a caminhar para o quarto dele, quando 133144 abriu a porta do quarto em que estava.
Parecia algo automático, pois ambos abriram os braços ao mesmo tempo e disseram um ao outro em uníssono:
-Desculpe !
E um fraterno abraço ocorreu. De ambos as lágrimas caíam, e o Diretor  pousou a mão nos cabelos do garoto e disse:
-Eu tenho orgulho de você !
-Eu escutei da porta tudo o que você disse, e reconheço que o julguei mal sem conhece-lo direito.
-Eu também, garoto, eu também. Só convivendo para conhecer, não é? A gente aprende muito nesta vida...Mas quero que saiba...Eu só quero que você seja feliz, só isto, e que você realize seu sonho, pois realizando-o, realizará o meu também. Boa noite, gente, vou dormir !
Naquela noite terrível, onde nada mais seria o mesmo, nem nenhum de nós seríamos mais os mesmos nunca mais, todos fomos dormir pensativos.
E emocionados !

(Por continuar)

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