O Mundo Secreto de Kaspar Kaperger
(Minissérie)
Episódio
1
Alemanha,
1974:
Ah, ninguém sabia
ainda o verdadeiro Kaspar Kasperger que existia dentro do Kaspar Kasperger, os
dois, um público e outro privado, eram muito diferentes entre si, mas ao mesmo
tempo muito iguais em muita coisa, sobretudo a Essência de Ser.
Naqueles meus
saudosos tempos de menino, Kaspar viva ali, naquela pequena vila perdida no
interior da Alemanha, uma cidadezinha dominada por sua Universidade, um velho conjunto
de prédios em que seu pai trabalhava, perdido em meio a uma floresta de
buretas, pipetas, frascos, balcões e geladeiras daquilo que na época muita
gente achava “um trabalho meio louco de cientista”.
Na verdade talvez
Kaspar fosse muito mais que um simples menino, por conta do seu Mundo Secreto
que ele guardava a sete chaves dentro de si, porém, não deixava de ser um
menino!
-Kaaaspaaaaar ! Era
o que ele ouvia sempre que ele aprontava
alguma coisa, mas seus pais sabiam sempre exatamente onde podiam encontra-lo: na garagem de casa!
Eles achavam que ele
não batia muito bem da cabeça, por ficar tanto tempo ali, de costas para eles e
de frente para os carros, sentado no degrau em silêncio, com um olhar que a
eles parecia perdido no nada, sozinho, isolado, parado ali por horas!
-Mas que raio de
menino diferente era aquele, por que ficava todo dia daquele jeito? Porque será
que ele nasceu assim?
Eles diziam um ao
outro !
Na verdade isto
fazia parte do seu Mundo Secreto, no entanto, numa coisa eles tinham razão: ele
já nascera assim, e desde que ele se
conhecia por gente sempre foi e sempre gostou de ser assim, aquele
menino obstinadamente diferente, recusando-se terminantemente a ser como todos
os outros, inconvencível !
Aquela parecia uma
manhã de domingo como tantas outras, e ele desceu as escadas e tomou o café da
manhã correndo e foi direto para a garagem, como ele sempre fazia.
Lá ele entrava no
seu Mundo Secreto e lá ele se divertia!
Naquelas
dependências ficavam dois automóveis Mercedes: uma 450 SEL 6.9, verde e uma
perua 280TE, marrom.
Às vezes eles
ficavam para fora da garagem, no jardim, onde dava para ver os carros dos
vizinhos , estacionados dos lados de minha casa.
E ele sempre teve fascinação
por automóveis desde a mais tenra idade, era uma fixação, eu colecionava
revistas de carros, tinha uma coleção de carrinhos de ferro, e sabia tudo sobre
eles, detalhes técnicos que muito adulto nem tinha idéia, ou não se interessava
em saber. Uma das coisas que ele mais adorava era percorrer as ruas da
vizinhança, olhando os carros que estavam estacionados e os que andavam por ali.
Naquele dia, como
sempre, ele se sentou no degrau da soleira que separava a cozinha da garagem, e
começou o seu ritualzinho diário:
- Bom dia, Bigodão !
-Ow, bom dia, Kaspar!
Está um lindo dia hoje, não?
Ele olhava o 450 SEL
6.9 e o identificava com um senhor de fartos bigodes, pois ele tinha, logo
acima do para choques, umas lâminas de metal com borracha, que ele chamava de
sobre para choques, que pareciam bigodes do lado da boca, ou seja, da grade, e
abaixo dos olhos(faróis).
-Bom dia, Teresa!
Ele agora falava com
a 280TE. Ele a chamava de Teresa, por que ela tinha as letras T e E no nome e
porque um dia ele assistiu um filme que tinha uma moça extraordinariamente
bonita que se chamava Teresa. Como era um nome muito diferente dos tradicionais
alemães, ele gostou dele e quando a perua chegou, logo a chamou de Teresa.
-Bom dia, Kaspar,
como você está bonito hoje !
-Obrigado, Teresa,
você é muito gentil !
-Eh, rapazinho, alto
lá ou eu vou ficar com ciúmes! Ela é minha esposa !
-Deixa de ser bobo,
meu bem, ele é só um menino, não está vendo? E ele não é carro como nós!
-É verdade, é
verdade, criei uma situação meio constrangedora, desculpe, Kaspar!
Kaspar riu e
respondeu:
-Imagine, Bigodão,
fica tranquilo!
-Obrigado. bom, e
aí, Kaspar, quais são as suas novidades de hoje?
Ele ia responder,
mas o vizinho da esquerda tirou seu BMW da garagem e o deixou estacionado no jardim,
próximos dos seus carros.
É, na verdade eram
dos seus pais, mas ele os considerava seus, pois eram seus amigos de quem ele
gostava muito!
-Ah, mas tinha que
aparecer este bendito dentuço convencido !
Disse Bigodão,
contrariado, com desprezo.
Kaspar chamava os
BMW de dentuços por que sua grade parecia dois dentes incisivos salientes no
meio da boca.
-Ah, qual é, ô, do
bigode? Convencido é você, com esta estrela enfiada no nariz, mais parece um
nariz empinado!
(Por continuar)
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