quarta-feira, 5 de abril de 2017

Episódio 3- O Mundo secreto de Kaspar Kasperger




Kaspar estava imensamente revoltado com aquela realidade cruel, de certa forma decepcionado e se sentindo rejeitado com as vãs tentativas dos seus amigos de quatro rodas de o consolar!
Era a primeira vez que Kaspar tomava ciência de que carros também não eram eternos e podiam desaparecer da sua vida e sem nunca mais os encontrar, uma face dura e cruel da vida não só para eles, mas para ele igualmente ,pois os tinha como amigos e até então, achava que amizades durassem para sempre!
Então, uma noite depois, Kaspar pegou as chaves do Bigodão escondido, e abriu o portão da garagem, aproveitando-se que todos tinham ido dormir.
Entrou no carro e deu a partida, o motor pegou na hora.
-Kaspar, onde vai me levar a esta hora? Seu pai sabe que estamos saindo?
-Eu não vou te deixar te levarem, Bigodão, não vou mesmo!
-Meu jovem, é muito perigoso a gente sair à noite, sem consentimento, sem destino, você ainda é muito inexperiente !
-Ninguém me segura mais, eu vou, nós vamos!
Kaspar ligou os faróis, deu ré, e ganharam as ruas, e saíram correndo livres velozmente, e logo pegavam a estrada.
-Garoto, estou te falando, a polícia pode aparecer, você está correndo muito, se eu bater eu irei morrer ou poderei ir direto morar no ferro velho, e você pode se machucar sériamente ou mesmo morrer, nesta velocidade posso não ser capaz de te proteger, por favor, vamos voltar!
-Não, não, eu não vou te entregar para ser vendido! Nunca vou deixar você ir embora!
Repentinamente começou a chover e a pista ficou escorregadia.
Veio a aquaplanagem e  Kaspar perdeu totalmente o controle e rodou muito rápido.
Em desespero,  ele não sabia o que fazer, parecia que iam bater!
Para a sorte deles, pararam a centímetros de um barranco.
Pálido de medo, trêmulo, muito a contragosto  Kaspar resolveu voltar, desta vez bem mais devagar.
Porém, quando já estava perto de casa, tomou outro susto:
Cruzando o caminho dele estavam seus pais, a bordo de Teresa, procurando desesperadamente por Kaspar!
O garoto parou imediatamente o carro, e seu pai estava furioso: Kaspar  levou a maior bronca de toda a sua vida, e sua mãe assumiu o volante do Bigodão, enquanto Kaspar sentava no banco do acompanhante de Teresa, com seu pai dirigindo.
O garoto ficou um dia inteiro de castigo, mas a punição mais pesada para ele foi ser forçado a ficar longe de Bigodão e Teresa!
No dia seguinte ao término do castigo, Kaspar pediu desculpas aos dois, que no entanto, não ralharam com ele e procuraram  consolá-lo novamente. Então, antes de sair da garagem, Kaspar fez uma promessa solene:
-Bigodão, eu juro que você vai ser o meu carro ! Eu nunca vou te abandonar e vou passar o resto da minha vida procurando por você onde for, vou te encontrar e te restaurar, você vai ficar novinho de novo, você vai ver ! Vamos ser companheiros para sempre ! Eu juro, juro mesmo, e tudo o que eu juro e prometo, eu cumpro, você me conhece, é uma questão de honra para mim e eu levo a honra muito a sério !
Bigodão olhou para Teresa com um olhar comovido, emocionado, mas descrente e suspiraram...
O dia em que seu pai foi levar Bigodão para a concessionária para entrega-lo foi um verdadeiro drama para Kasper:
Ele entrou no carro e o garoto  pediu ao pai diversas vezes para que não o entregasse, mas, de cara fechada com sua revolta, e também com a testa franzida de preocupação, seu pai entrou no carro e saiu com ele ganhando a rua.
Sua mãe tentou  abraça-lo para tentar  segurá-lo e o consolar, e ela estava de olhos rasos, mas ele se desvencilhou e saiu correndo atrás do carro:
-Bigodãaaaao, não vá embora, não vá, não me deixe sóooo!
Mas, triste, ele era uma máquina comandada por mãos e pés humanos e se foi. Anos depois seu pai  contaria para Kasper: não era só a mãe dele que ficara de olhos rasos, também seu pai os tinha ao ir para a concessionária...
Kaspar voltou para a garagem e abraçou sua mãe, chorando convulsivamente, e ela tentava  consolá-lo com carinho.
Aquele fora talvez o dia mais triste de sua vida, e Teresa também estava extremamente triste, e ,abraçado com sua mãe, Kaspar olhava para Teresa, e notava, podia sentir o quanto ela estava deprimida e emocionada, o quanto ela estava sofrendo: ela também gostava muito do Bigodão !
Algumas horas depois seu pai chegava na nova 600 SEL do ano, e a colocou na garagem, e para Kaspar,  vê-la chegar no lugar do velho Bigodão foi de cortar o coração ! Ele tinha se apegado muito, era como se ele fosse o avô que o garoto nunca tinha tido na vida!
Não era a mesma coisa, com aquele carro eu não se identificava, e tinha raiva dele por ter tomado o lugar do Bigodão em sua vida, e com ele Kaspar não falava e ele também ficava em silêncio: para o garoto, ao contrário dos carros a que ele tinha se apegado, ele não significava nada, então não havia como ter uma comunicação ali, pois ele, ao contrário de Bigodão e Teresa, para Kaspar não tinha alma !

(Por continuar)

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