quinta-feira, 6 de abril de 2017

Episódio 4- O Mundo Secreto de Kaspar Kasperger





E seus pais não tinham idéia do quanto aquilo significava para ele...
Foi no dia seguinte que  Kaspar sentiu naquela garagem a aridez de um deserto. Bigodão não estava mais ali, e o carro novo? Ah, ele continuava a não conseguir sentir nada por ele, exceto pelo sentimento de raiva, frustração, impotência, um intruso que estava ali contra a sua vontade, e que se dependesse de Kaspar, não teria lugar ali,  emburrado, ele  não falava com ele não falava com ninguém.
Teresa se sentiu tão deprimida   ao notar que o garoto parara de falar com ela e remoía seus ressentimentos e mágoas em silêncio, que também ela se calou. Ela já ficara triste pela ausência do Bigodão e seu carisma que dominava o ambiente, que Kaspar deixar de falar com ela e ela presenciar seu sofrimento foi demais para ela...
Ou, pior, sua capacidade de falar com os carros e entender o que diziam se esvaiu. Uns tempos depois  ele tentou retornar a falar com Teresa, mas não houve resposta. De repente tudo era um silêncio mortal. Na época, ele não sabia se ela é que se calara, se ele que tinha perdido minha habilidade mágica de conversar com os carros e entrar em sintonia com a alma deles, ou o que, afinal, tinha acontecido. Só sabia que aquela constatação fora um grande choque, um trauma, como se algo muito importante tivesse sido tirado de si! Havia frio, vazio em sua alma, nem ele sabia expressar para si mesmo o que ele sentia...
Fosse Teresa que tivesse se calado, fosse o problema com a sua habilidade, só o silêncio imperou, um silêncio doloroso que lhe trouxe muitas saudades dos velhos tempos!
Para piorar, dias depois seus pais se separaram e ele e seus irmãos foram morar em outro bairro da cidade com sua mãe.
Teresa, ao menos, lhe era familiar, mas alguns meses depois também ela se foi, substituída por um C230 K Touring, a qual também não falava nada com ele, nem ele com ela, e por quem ele nada sentia. O ressentimento, a dor, a tristeza, a mágoa, o trauma eram os mesmos, ou talvez até piores, pois agora nada mais havia de familiar naquela parte da sua vida.
Não obstante isto, sua mãe sempre lhe emprestava o carro dela e ele ia na concessionária ver o Bigodão, no pátio de carros usados para venda. Mas, para sua tristeza e decepção, ele também não mais falava. Parecia morto, pois nem o ouvia também. Ou talvez ele que já fosse incapaz de escutá-lo...
Um dia ele voltou de uma destas visitas (e ele o visitava todos os dias, obcessivamente), e não o encontrou mais. O vendedor  explicou a ele que ele tinha sido vendido, mas se negou a revelar para quem, o endereço, etc.
Ao estacionar o carro de sua mãe na garagem da casa dela, Kaspar sentiu a maior solidão da sua vida e chorou, chorou muito, até que viu, passando pela calçada uma linda  moça ruiva da mesma idade que ele.
Aquela visão lhe despertou algo que nunca sentira antes: paixão!
Dias depois, ele ganhava de seu pai meu primeiro carro: uma Classe A 190 prata, com a qual eu se identificou imediatamente.
Mas agora já influenciado pelo fogo da paixão, já não mais falava nem conversava com carros.
O tempo passou, e de tanta insistência, Kaspar conquistou Gretel, a ruiva por quem ele me apaixonara.
Kaspar  agora já era formado em engenharia e estava independente e foi morar sozinho. Não demorou  e Gretel foi morar com ele e os dois se casaram.
Mas Kaspar nunca me esquecera de Bigodão. Ele sonhava com aquele carro toda noite, e em seus sonhos Bigodão lhe pedia socorro!
Kaspar passou a procurá-lo, obstinadamente, pois lembrou-se de sua promessa; agora que ele já tinha seu próprio dinheiro e ganhava bem, a ponto de ter trocado a velha Classe A por um potente C240 2.6 ;  ele viajou a Alemanha toda procurando por Bigodão, e ele  tinha um forte pressentimento de que eu iria encontra-lo.
E de fato, um belo dia, encontrou-o em um ferro velho, e o salvou de ser prensado e destruído. Colocou-o em um caminhão no estado em que estava, para sua garagem e foi comprando as peças e ele mesmo o foi restaurando ‘a mão.
Depois de muito tempo restaurando-o, já era tarde da noite, quando  Kaspar finalmente terminou.
Feliz, com um sorriso de menino no rosto, capô baixado de novo, ele deu a partida. Nada! De novo e de novo, nada !
Desesperado, começou a revisar item por item do sistema elétrico por algum engano, e não achando nada, ele disse em voz alta:
-Bigodão, por favor, desperta! Acorda, por favor, acorda! Eu sei que você está aí em algum lugar !
O portão da garagem estava aberto e a lua cheia brilhava no céu, e então Kaspar  vi uma estrela cadente passar.
Emocionado, eu disse:
-Estrela, minha estrela da sorte, faz ele voltar, por favor, te peço do fundo do meu coração, faz  ele voltar!
Não se sabe  se foi impressão a dele, mas lhe pareceu que a estrela cadente brilhou, e a estrela no alto da grade de Bigodão brilhou ao luar também, e repentinamente, para a sua surpresa, súbitamente  seus faróis se ligaram sozinhos e o motor pegou e rugiu com saúde, e logo depois a buzina tocou duas vezes!
-Estou de volta, garoto !
-Bigodãaaao !

(Por Continuar)

Nenhum comentário:

Postar um comentário