quinta-feira, 26 de março de 2015

O Presídio -Episódio 54



Depois de tão auspiciosa conversa, voltei ao meu trabalho.
Sem a 220967 no comando, o clima na DIIS era outro. 500800 estava implementando uma nova política interna de comportamento pacífico e respeitoso no departamento.
Porém, eu via nos olhares dos funcionários burocráticos, guardas e agentes, um ódio mal disfarçado. Eles e elas amavam  a 220967 e apreciavam seu estilo ditatorial, frio e insensível, e detestavam o jeito humanitário e sensível de gerir da sua substituta. Odiaram mais ainda quando ela mudou a política de seleção e o conteúdo da Academia Preparatória da DIIS, pois antes só eram escolhidos os guardas comuns mais violentos, ferozes, frios , insensíveis, e os que eram diagnosticados como psicopatas eram os que passavam na frente e eram escolhidos para passar. Agora era o contrário, e os instrutores, acostumados a todo tipo de barbárie e violência, não se conformavam em  ter de abandonar seu estilo militar e sádico de treinar.
Eu via os vídeos da vigilância interna, horrorizado com o que falavam da minha nova assistente e de mim também, já que me consideravam frouxo, bonzinho demais e que queriam alguém do estilo deles para me substituir.
Alarmado, percebi que um verdadeiro motim se aproximava, e que aquilo poderia virar uma verdadeira guerra civil. Afinal, eles eram a Polícia de Choque do Presídio, e o que pode acontecer se a própria Polícia de Choque, que deveria conter os levantes, se revoltasse, pegasse em armas e comandasse uma rebelião, uma revolução?
Seria por demais perigoso e poderia terminar numa terrível chacina, já que só eles dispunham de armas, e os presos não. Os próprios guardas comuns normalmente só portavam cassetetes e algemas, não armas de fogo. Eu não teria como contê-los, nem o próprio Diretor poderia, por mais autoritário que fosse!
Resolvi por bem conversar com o 133144, e ver com ele quais providências poderíamos tomar.

-Claro que eles também não devem estar se conformando em que a 220967 tenha sido expulsa da DIIS. Fizemos bem em não ter mantido ela presa, nem a matado, ou a revolta já poderia ter acontecido. Acabamos trazendo-a para o nosso lado e a fizemos nossa aliada, uma aliada importante. Foi mesmo uma sábia resolução. Mas eles podem tentar trazê-la para o lado deles, para liderar o Levante. Não duvido que o planejamento dele já deve estar em curso, e estou achando difícil evita-lo. Talvez eu realmente tenha errado em colocar a minha esposa como vice-chefe.
-E se eu a demitisse e escolhesse outra pessoa para o cargo,133144?
-Bom, isto aliviaria a tensão, e talvez nos fizesse ganhar algum tempo, mas este episódio fez com que eles ficassem tentados pelo Poder, e deve ter despertado neles a ãnsia por um Golpe de Estado mais profundo, tentando derrubar o Próprio Diretor e assumindo a Administração, o que seria um desastre: uma ditadura sendo substituída por outra ainda maior! De qualquer modo, acho que devemos ter uma reunião de Cúpula com o Diretor, expor a situação, as provas e decidirmos o que fazer. Na minha opinião, o certo era fazer a dissolução da DIIS, que numa Nova Ordem já não seria mais necessária.
-Mas isto faria os revoltosos ainda mais enfurecidos! E quem lhes tomaria as armas?
-Eu hoje à noite vou pedir para a 500800 renunciar amanhã mesmo. E vou solicitar ao Diretor o agendamento da Reunião de Cúpula.
-Será que ele já não está sabendo de tudo,133144? Será que ele já não estaria preparando suas próprias medidas?
-Com certeza está, mas se quisesse agir agora, já teria agido. Se não agiu até agora, é porque quer que participemos das decisões! Mas uma coisa eu te digo, meu amigo: sejam quais forem as medidas a adotar, a 220967 estará inclusa e terá de fazer parte dela.
-Será que eu devo renunciar também?
-Não, 100169, ao menos agora não. Ou o DIIS estará inteiramente a cargo do departamento. É que a 500800 está com sua gravidez avançada, e correrá sério perigo de vida se continuar lá !Francamente, eu queria, e quero fazer uma revolução, mas eu não esperava ter de enfrentar uma contra revolução reacionária primeiro !Eu deveria ter pensado nisto antes !
-Não se culpe, 133144, são as imprevisibilidades da Vida...
-Não é só isto, é inexperiência no lidar e conhecer as pessoas, eu errei ao não estudar os agentes da DIIS e sua mentalidade, que estava tão óbvia, e na minha ingenuidade, deixei tudo isto passar...
-Julgar a si mesmo e se condenar não vai fazer o tempo voltar, nem resultará em nada de efetivo para salvar nossa pele, 133144 !
-Você tem razão, meu amigo, é verdade. Vamos então ter atitudes positivas diante da Vida e procurar reagir e tentar evitar esta catástrofe !
-Muito bom, é por aí ! Mas sabe outra coisa que me preocupa? Alguns dos agentes de escalão mais alto tem frequentado a Bibilioteca e sabe qual o livro em que mais se detiveram a estudar?
-O Príncipe, de Maquiavel?
-Não. Mein Kampf, de Adolph Hitler !
Os olhos de 133144 se arregalaram diante da minha resposta, que tive a impressão de ter sido totalmente inesperada para ele !
-Oh, não ! Não...ah, pombas, então a situação é ainda mais grave do que eu estava pensando ! Eu nunca deveria ter deixado este pessoal frequentar a Biblioteca...
-Mas não tinha como, nossa revolução é democrática !
-Tens razão, 100169, bom, vamos torcer para que nossas medidas sejam tomadas a tempo e sejam efetivas.
Não demorou, e a Reunião de Cúpula foi marcada para aquela mesma noite, no Gabinete do Diretor.

(Por continuar)

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