Mas talvez eu estivesse exigindo demais dele. Não, não havia como
adivinhar que o Diretor seria uma pessoa assim !
Eu mesmo o imaginava como um senhor obeso e meio careca, de
estatura baixa e rosto limpo, e via agora que eu estava redondamente enganado.
Eu também não esperava que fosse um homem tão manipulador e cruel,
mas, talvez, apenas talvez, isto fosse uma impressão a minha, pois eu só tinha
podido ver a superfície, não conhecia o verdadeiro homem por trás do homem. Talvez
fosse cedo para julgar, e o próprio 133144 já me alertara que não se deve pré –julgar
ninguém antes de conhecer a pessoa em profundidade.
Então não havia como adivinhar como seria o Cidadão Zero, era uma incógnita
para nós dois. E se não dá para advinhar, não dá para se culpar.
Mas eu via uma grande diferença entre eu e o 133144: ele fizera e
alimentara, grandes expectativas em relação ao Diretor e se julgava capaz de
enfrentar qualquer tipo de pessoa, confiando arrogantemente na sua sapiência
adquirida pela literatura. Eu fui com o espírito vazio de expectativas, ou
talvez não, apenas com expectativas negativas, de ser incapaz de enfrentar alguém
tão poderoso.
Mas foi chocante para mim, embora eu pense que para o 133144 tenha
sido ainda mais, perceber que o Diretor era muito mais poderoso do que eu e ele
pensamos, e qual não foi nossa surpresa!
Sinceramente, eu estava me sentindo inseguro. Muito inseguro. Não
tinha idéia do que nos aconteceria.
Mas talvez o pior mesmo fosse para o 133144: ele se rebelava
contra o Presídio, o sistema, e sabia que haviam milhares de câmaras e
microfones espalhados pelo Presídio e pela caverna, e que, portanto, seria
impossível fazer ou planejar alguma coisa sem que o Diretor saber. Porém o que
agravava tudo mesmo é a desconcertante autorização do Cidadão Zero de ele se
rebelar e promover uma revolta no Presídio. E porquê? Por que se, no caso, se
rebelar era obedecer, a autorização oficial fazia com que esta rebelião não
fosse mais uma rebelião, e sim, o acatamento de uma ordem.E não se rebelar
seria acatar outra ordem e fazer a vontade do Diretor também.
Não, eu não podia negar, nem deixar de admirar, agora que eu
percebera, a inteligência do Cidadão Zero!
Era algo de genial, estratégico, de uma lógica impecável!
E mal sabia eu, aquela seria apenas a primeira visita do 133144 ao
Diretor!
Agora, qual seria a intenção dele para com o garoto?
Isto só ficaria claro mais para a frente...
Por ora, porém, 133144 ficava passando os dias e noites pensativo
e tendo longas conversas com 500800, e cuidava dela também, de seus enjôos e da
gravidez dela, que avançava.
Ele me dizia, nas poucas conversas que tinha comigo, que não sabia
mais se valia a pena continuar indo na biblioteca, pois se o Diretor sabia até
o que ele lia, ele não tinha como ter algum conhecimento que o Cidadão Zero não
tivesse. Mas o pior não era saber que a autorização para frequentar a
Biblioteca tirava de suas incursões a sua clandestinidade, tirando delas o
potencial revoltoso; era saber que, se o Diretor sabia tudo o que ele lia, isto
significava que o Diretor já tinha lido a biblioteca inteira, todo o acervo!
Como usar o conhecimento como arma , se o oponente já o tem?
133144 angustiava-se em dilemas, e eu começava a achar que era
esta a precisa intenção do Diretor!
Mas com qual finalidade?
Na época, eu era simplesmente incapaz de responder !
(Por continuar)
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