Calor. Calor intenso era o que se sentia,
enquanto as chamas percorriam os pântanos em meio ‘a desolação que se via,
chamas que consumiam também uma cidade inteira, dali muito próxima.
Fogo, sangue, suor,corpos putrefatos, odor
insuportável, destruição, consternação.Sotto ardia como que em febre, reflexo
de um mundo doente.
As poderosas e burocráticas forcas imperiais
assistiam ao triste espetáculo daquelas paragens de morte.
O vento ,qual entidade de braços de fogo,
espalhava ainda mais a destruição,levando a desgraça para onde quer que ele
apontasse.
Restava o vazio , a falta de esperança, dos
poucos moribundos que ainda teimavam em não sucumbir a pressão da extinção,mas
todo seu esforço para tentar continuar vivendo parecia a eles próprios ser em
vão.
A fome de vida das chamas que dançavam sua
valsa ardente parecia inesgotável, e a fumaça exalada tão celeremente parecia
que a tudo cobriria inevitavelmente.
Quanto mais as chamas se agigantavam,
mais alto era o ranger de dor da velha
cidade de Sotto, cujas casas queimavam em profusão.
Eis que então surge um vulto em meio às
chamas.
Esta sombra avassaladora dirigiu seu olhar
para alguém que jazia em meio às chamas, ainda viva, mas mal respirando.
Era uma mulher jovem, recém saída da adolescência,e ainda que toda
marcada por queimaduras, permanecia linda.Seus cabelos eram
de um negro brilhante, ainda que chamuscado, seus olhos azuis brilhavam
como diamantes, e lágrimas corriam deles.Semi nua, com o vestido parcialmente
consumido pelo fogo e muito rasgado,exibia um corpo generoso por abrigar uma vida nova dentro de si, que lutava para nascer.
O vulto a pegou nos braços, e emergiu das
chamas.
Tal era seu tamanho , que assustou os
soldados.
O Gigante segurou a garota com um braço e
levantou o outro, em cuja mão estava uma enorme e refulgente espada.
Da arma um raio poderoso emanou, e afastou as chamas de seu dono poderoso.
Foi quando, em meio ‘a tanta dor ,os olhos
da moça se fecharam para sempre.
O Gigante deixou cair a espada, e levantou a
sua amada acima da cabeça e um brado ecoou:
“-Nãaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaao!”
Em desespero, o Guerreiro chorava.
Caiu de joelhos e a colocou no chão, mãos no
rosto.
“-Tanto poder, e não consegui salvá-la...não
mereço viver, eu falhei, falhei, falhei completamente...” Pensava o gigante
consigo mesmo, enquanto sua angústia continuava a lhe atormentar:
“Eu não podia falhar, não podia, ela
dependia de mim, oh, Ciris, eu a decepcionei, não e´mesmo?Fui incompetente,
impotente, cheguei tarde demais,falhei...como posso me perdoar, se jamais me
perdoarás?”
Era o que ele sentia, amargurado,
arrependido, desolado!
O sangue dela ainda pingava de suas mãos
quando ele subitamente olhou para os soldados atônitos, e então, o gigante não sabia
mais se vivia ou sonhava, pesadelo que jamais terminava, sofrimento continuado
de toda uma vida.
Agora toda aquela desolação se tingiu de
vermelho, e ele a colocou delicadamente no chão, e se pôs de pe´, depois de empunhar a espada novamente.
Seu semblante subitamente mudou de
consternado para colérico, e aos brados, avançou contra os soldados num
ataque avassalador e histérico!
Atravessou o pântano com fúria assustadora,
demonstrando uma energia incontivel. Os raios
eletromagnéticos de sua espada afastaram as balas de seu corpo, tornando
inúteis as armas dos soldados.
Frenesi de sangue se abateu sobre o exército
imperial.
Uma multidão sem rosto se abateu sobre
Gigas, o guerreiro gigante, que desapareceu sob tamanha pressão para ser finalmente esmagado,ainda que a muitos tenha valentemente abatido.
Um único soldado se aproximou do corpo sem
vida de Ciris, e abriu o ventre avantajado da moça, e de la´saiu um bebê,
ainda com vida.
Espantado com a beleza cândida e inocente
daquela nova vida que irrompera diante
da destruição,o soldado tomou para si o bebê em seus braços fortes, enquanto
grossas lágrimas abriam caminho em meio ‘a sua barba cerrada.
-General ! Gritou o soldado.
-Sim, soldado?
-E´uma menina, senhor. Quero me apossar
dela.Gigas deu a vida dele para protegê-la, e a mãe dela também, e eu...minha
mulher não pode ter filhos, senhor, e eu..eu sempre quis ser pai!
-A filha do nosso inimigo e´nossa inimiga,
soldado Tarkis.Mate-a.
-Sinto em ter de desobedece-lo, senhor, pode
me punir, mas eu acho que ela merece uma chance de viver, já que eu a trouxe ao
mundo por piedade, e a vida dela já custou tantas vidas assim.Eu ofereço minha
própria vida, para que a vida desta criança seja poupada.Eu vou criá-la como se fosse o pai verdadeiro dela,e vou
criá-la e educa –la nos preceitos do Império, então ela será um
dia uma importante aliada, senhor.
-Então, que assim seja. Vejo que ser
magnânimo não e´privilegio somente dos nobres, mas dos nobres de alma e
coração.
-Obrigado, meu senhor. Doravante o nome dela
será´ Nimitris, aquela que veio do fogo!
E foi
assim que se originou a velha lenda da invicta Filha das Chamas, aquela guerreira ,filha da união apaixonada de um gigante e uma sacerdotisa,que jamais se
rendeu...
Fim
Cristiano Camargo
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