sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Sensibilidade de Viver -Prelúdio ETP-Episódio 37



-Eu entendo sua necessidade de observar e ficar fora e acima da sociedade e também o valor que você dá a sua identidade. Isto é intrinsecamente humano, Lune-san, sinto em dizer que isto não a faz diferente das pessoas em geral, mas você tem sim um diferencial !
-Qual é este diferencial, Takeo-san?
-Se você observar atentamente a si mesma, Lune-san, verá que você observa tudo racionalmente, friamente, sem emoções, objetivamente. Não “sente” o que observa. Às vezes precisamos sentir o que observamos, não apenas racionaliza-los. É uma nova maneira de observar o mundo, as pessoas, a vida.”
-Entendo. Mas se eu “sentisse”, meu diferencial estaria arruinado, e eu seria apenas mais uma pessoa, como as outras, perderia minha identidade, minha essência!
-Será mesmo, Lune-san? Eu não diria isto, pois este não é seu único diferencial. Além disto, não se trata de ser absorvida pela massa, mas trocar gestos, emoções, enriquecer-se. Você é o que você é, com suas características próprias, um ser humano lindo, especial, nunca deixará de ser.
-Interessante. Exponha para mim então o seu conceito de “Diferencial”.
-Muito bem, Lune-san, como sabe tudo o que pensamos existir, e que, como você mesma diz, nem por isto realmente existem, tem várias interpretações, posso dizer mesmo infinitas, cada uma carregando seu próprio significado Diferencial é essencialmente um elemento separador. Um intruso, podemos dizer, que cria no objeto algo que faz este objeto ter algo a mais, ou a menos, ou algo que faça com que o observador atento não confunda este objeto com “n” outros semelhantes.
Lune contou então a ele a confusão mental que povoou a mente a tarde toda. Claro que Takeo abriu um largo sorriso ao ouvir que era desejado sexualmente por ela, ele mesmo se excitou e sua imaginação voou longe, e ele teve muito trabalho para se conter, pois sabia que tinha de esperar a hora e o clima certos, e não queria colocar nada a perder novamente, afinal, estava, pensava ele, no caminho certo para conquista-la !
-Não posso dizer que eu entenda o que você sente, Lune-san, pois seria muita presunção e falsidade da minha parte. Mas vejo, por outro lado, que você está confusa, você está acostumada a pensar sozinha, consigo mesma, você , é fácil notar, é alguém fechada ,introspectiva, tímida, e de certa forma criou um “mundo“ seu em que você gosta de viver, um mundo interno, dentro de si mesma, onde você gosta de observar o mundo lá  fora, mas não o aproveita. Você diz observar a realidade, a externa e muitas vezes analisa sua própria realidade interna, e agora, pareço um elemento estranho, que a influencia e a atrapalha a viver esta fuga da realidade. Por outro lado, quando você fala de sexualidade, note, por favor não me leve a mal, quero expor isto a você da maneira mais delicada possível, mas não há na verdade muito espaço aqui para delicadezas : penso que você está falando apenas de coisas teóricas, as quais você nunca experimentou na sua vida, e não sabe o que é, na verdade a realidade delas. Mas isto é porque esta é uma realidade que não é para ser pensada, mas sentida. Você precisa sentir a vida, Lune-san, não apenas pensar nela. Procure observar sentindo, procure   sentir as emoções das pessoas. Há todo um Mundo emocional lá fora para ser sentido, e acho que você, de certa forma tem empreendido uma fuga da sua realidade emocional, que agora está começando a se manifestar !
-Fuga da realidade...emocional, Takeo-san? Interessante!  Eu observo a realidade, mas nunca levo mesmo em conta as emoções e sentimentos, estou sempre atualizada com o que acontece na realidade racional, mas não com esta nova que você está me mostrando agora.”
-É que você se coloca acima dela e não participa dela, Lune-san. O ser humano é  um ser social, que vive numa sociedade complexa, claro que se pode rotula-la de corrupta, doente, injusta, mas é a sociedade em que vivemos e fazemos parte, e somos parte da cultura que nos foi passada. Suas reflexões a levam para fora da sociedade e a negar os valores cultuados, mas no entanto, a levam a simplesmente ignorar a realidade emocional, Lune-san. O ser humano é um ser dual, e os grandes paradoxos e dilemas humanos são resultantes desta interação dialética entre a razão e a emoção, então, não há nada mais intrinsecamente humano do que os conflitos e a ambigüidade!
- Nisto eu concordo contigo! Muito bem! E porque participar dela, Takeo-san ? Porque fazer parte da massa e perder a privacidade, ser invadida, saqueada, ir para o Nada, fazer parte do Nada?
-Porque a existência humana é muito curta e precisa ser bem aproveitada, querida. O fato de você viver na sociedade e participar dela e seguir as regras naturais, como a reprodução, por exemplo, não quer dizer que você passará a fazer parte da massa indistinta e perderá sua identidade, pois você tem suas próprias idéias, valores, sentimentos, sensibilidade, e isto ninguém te tirará.
Claro que eu expondo minhas opiniões aqui, estou agindo como um agente influenciador, ainda que eu não queira, e não quero, mas minhas opiniões não são ordens a serem seguidas, você tem o livre arbítrio de segui-las ou não, ou mesmo parcialmente, e’ seu direito. Sabe, Lune-san, você, à primeira vista parece uma garota insensível e séria, fria, mas não o é. Você apenas tem dificuldade de expor suas emoções, mas isto não significa que não as tenha, e você as tem, e muito profundas!
-Obrigada, mas você fala de regras naturais, reprodução, mas para você é fácil falar isto, você é o agente ativo da reprodução, e eu sou o passivo. Isto é uma hipocrisia. Eu não posso falar destas coisas com a mesma facilidade que você, nem aceita-las com esta tranqüilidade!
Takeo engoliu em seco, ele percebo que ele sendo rude e grosseiro com ela.
-Você tem razão, Lune-san. Mea culpa. Porém, não fica bem eu discutir sobre sexo com você, não quero encabulá- la. Só posso dizer, no entanto, que o fato de ser o elemento passivo, não a torna inferior, e na verdade este papel não é tão passivo assim, mas eu respeito sua opinião. Só posso elogiar a sua franqueza e o modo claro e direto como expõe suas idéias, você e’ muito inteligente!
Lune então percebeu nas palavras dele uma certa aspereza, agressividade e machismo por detrás do que, à primeira vista parecia ser uma gentileza cavalheiresca. Um modo polido de responder ao insulto dela à altura, mas ao mesmo tempo,procurando não  insultar à ela. Ele estava sendo falso e hipócrita!
-Muito inteligente para uma mulher, é isto o que você quis dizer, Takeo-san? É arrogância que vejo em seu olhar? Ou está simplesmente querendo me bajular?
-Claro que não, querida. Não houve machismo em minha afirmação, nem e’ arrogância, meu bem. Também minha intenção não é a de procurar te agradar ou te bajular. Eu fui sincero. Mas pense, sabe, muitas mulheres dizem que é uma experiência maravilhosa a de ser Mãe, sentir um novo ser humano se desenvolver dentro delas, dar origem a vida, é um sentimento muito belo este da maternidade, querida, não é só um instinto, isto e’ um privilégio que os homens nunca terão.
-Ah, Isto é a resultante simplesmente dos fatores condicionantes sociais e históricos sobre a mulher, ela não só tem que reproduzir, mas ainda por cima é obrigada a gostar disto; é tal a insegurança, que a Mulher teve de criar um mecanismo emocional para complementar o instinto!
-Querida, você está falando de coisas que não domina...
-E você idem ! Você me joga na cara minha virgindade, e vem falar de ser mãe, e quer saber? Acho que para você não sou uma mulher, mas um corpo! Apenas mais um corpo do qual você quer se aproveitar! Se você tem planos de se casar e ter filhos comigo, esqueça!
Lune agora estava ficando nervosa!
Takeo baixou os olhos e a cabeça, parecia algo magoado. O olhar dele, perdido e triste , cruzou com o de Lune, autoritário. Ela, no entanto, refletiu consigo mesma que estava enganada a respeito dele. Não, pensava ela, ela não era apenas um corpo para ele,afinal; porém, o que estava claro e ela não queria admitir para si mesma, é que estava sendo influenciada pelos sentimentos dele e estava sensível a qualquer sinal de mágoa dele, que disparava na psique dela sentimentos de culpa e a vontade do lado emocional de protege-lo do lado racional dela, já que naquele momento, o lado vencia facilmente o lado racional!

(por continuar)

Nenhum comentário:

Postar um comentário