segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Naquela fria manhã de Outono-Episódio 67


 
Ayumi estava ali, estatelada no chão,semiconsciente, com as costas viradas para cima.Não sabia se dormia, sonhava ou o que via era real.
Ali, no meio da rua, um, dois, três, quatro, e dali há pouco uma multidão de corvos começou a se refastelar em seu corpo.Ela sentia as bicadas, e os nacos de sua carne sendo arrancados de si,sabia que estava sendo devorada ainda viva, mas ela já tinha se decidido a se entregar de vez para a morte.Não queria mais viver.Os bicos entravam pelas feridas abertas e as alargavam e aprofundavam e agora eram dezenas, centenas de bicos famintos.Ela, no entanto, mal sentia, enquanto ia sendo lentamente consumida.Não chorava mais.Parecia não mais sentir dor.Então ouviu latidos , e a revoada dos corvos.
Agora eram bocas ferozes, com dentes afiados, que devoravam sua carne.
Um dois, três, quatro, meia dúzia de cães vadios arrancavam verdadeiros bifes de suas pernas, braços,nádegas, costas.
Ela não esboçava reação.Seus olhos vidrados e sem expressão não se defendiam, ou melhor, um deles, pois o outro já estava destruído.
Os cães a disputavam entre si, e na briga, acabaram virando-a com o ventre para cima.
De seus braços já apareciam, brancos e brilhantes, seus ossos.Enormes nacos de carne e gordura lhe eram arrancados das coxas e panturrilha.O sangue vertia em profusão.
Uma boca abocanhou-lhe um dos seios, e o arrancou inteiro, em meio a esguichos de sangue.O cão o mastigou um pouco e o engoliu inteiro.Depois arrancou o outro e comeu.Ela então sentiu que os cães começavam 'a se alimentar de seus intestinos e outros orgãos, pois sentira que seu ventre fora aberto de vez e seus orgãos caíram na rua, para fora da cavidade abdominal,e estavam sendo devorados céleremente.Ela estava em meio à um lago de sangue.Por fim, o sangue que sobrou era pouco demais para circular pelo que restava do corpo, já que braços e pernas, e até os músculos que compunham a vagina já tinham sido inteiramente devorados, e os seus ossos já brilhavam ao luar.Antes de perder a consciência, porém, ela viu um cão arrancar-lhe as bochechas e os lábios. A última coisa que viu foi o interior da boca do cão, quando seu olho que ainda funcionava foi-lhe arrancado e esmagado pelas mandíbulas poderosas do canídeo, explodindo em uma poça de liquor transparente qual baba , escorrendo por entre os dentes dele.
A última coisa que sentiu foi os cães bebendo o seu sangue quando sua  veia carótida em seu pescoço foi destroçada, e o pouco que ainda lhe restava de sangue jorrou.Finalmente, seu último pensamento, enquanto o cão arrancava sua língua de sua boca e a engolia:
"-Finalmente .Estou morta.Agora posso descansar..."
E Ayumi morreu.
O dia raiou e quando as pessoas começaram a andar pelas ruas, espantaram os cães vadios e os corvos, e uma pequena multidão começou à se juntar em volta da carcaça dela.Sobrara quase nada, apenas ossos, e um ou outro naco de carne , além dos pulmões e do coração,ainda intactos.Na cabeça, até o couro cabeludo tinha sido arrancado, e os cabelos dela estavam jogados num canto.Boa parte do crânio dela aparecia, mas ,apesar do nariz arrancado, ainda era possível ter alguma noção de como tinha sido o rosto dela.
Izanami saiu da casa e pegou um táxi.Viu pela janela, por entre a multidão, a carcaça de sua sobrinha, toda destroçada, há apenas três quarteirões da casa,mas seu olhar era frio, cruel, impassível,mesmo sabendo, ou até mesmo por isto,que aquele corpo era da sua sobrinha.Seu pensamento foi:
"-Bem feito.Ela teve o que merecia.Foi pouco !"
E ela sorriu, para depois gargalhar numa risada maléfica !
Ela sentia enorme prazer e alegria no que tinha feito e estava tremendamente satisfeita com o trágico destino de sua sobrinha...
E ela foi para a casa de Maki.
Por falar nisto, aquela casa estava agitada:
Maki e Hideo, namorando muito, trocando amabilidades entre si na mesa da copa.Kuome abraçadinha e aos beijos com Midori, e Kaede de cara absolutamente fechada com Tetsuo,furiosa, após a briga homérica que tiveram durante a madrugada.Kaede estava num mau humor terrível, contrastando com a alegria e o amor dos demais casais na mesa.Tetsuo estava tão deprimido que nem ofereceu carona para os casais, e foi sózinho para a escola.Não demorou, Maki, Kuome, Midori e Hideo estavam indo estudar também.
Kaede estava  já de saída, quando um táxi deixou  Izanami na porta da casa.
-Pois não?
-Aqui é a casa dos Amagawa, não?
-Sim, eu sou Kaede Amagawa, no que posso lhe ajudar?
-Eu sou tia de uma colega de sua filha Maki, e preciso ter uma conversa muito séria com você.
-Pois não, entre por favor.
Izanami explicou, na versão dela os motivos de sua vinda.
-Por favor, quero pedir perdão para sua filha, por todo o mal que minha sobrinha fêz à ela. E ao namorado dela, Hideo, se não me engano, também!
-A Maki-san e o Hideo-san não estão.Foram para a escola.Aliás, acabaram se sair, se corrermos ainda os alcançaremos no caminho.A senhora quer ir comigo?
-Pois não,obrigada.
Kaede e Izanami entraram no Honda Civic na garagem e foram em direção à escola. No meio do caminho acharam Maki e Hideo, os colocaram no carro e voltaram para casa.
Ao chegar lá,Izanami se ajoelhou perante Maki, e pediu perdão, abaixando o tronco até o chão, com os braços esticados e as mãos espalmadas juntas.
-Imagine,  Izanami-sempai,fique tranquila, eu já perdoei a Ayumi-san.Não há o que perdoar!
-A senhorita é muito generosa, Maki-san, obrigada.Mas estou profundamente envergonhada pelos atos imorais e irresponsáveis da minha sobrinha, que envergonharam o nome da minha família e o desonraram!
-Ah, Izanami-sempai, eu acho que a senhora está exagerando, já passou...
-A Maki-san só tem quatorze anos, é incapaz de compreender conceitos como honra , Izanami-sempai.Disse Kaede.
-Entendo. Mas ao menos minha obrigação está cumprida.Gostaria de lhes assegurar que minha sobrinha foi severamente punida.Eu a chicoteei o quanto pude, e a expulsei de casa.Hoje cedo ela estava no meio da rua,devorada viva por cães e corvos, ela está morta, e assim, o nome da minha família tem sua honra restaurada. É como se ela nunca tivesse sido parte da família!
Kaede, Maki e Hideo ficam aterrados, pasmos, passados,mal podiam acreditar nas palavras hediondas daquela mulher!
-Que...horror !Balbuciou Kaede, ainda impressionada!
Maki começou à chorar,em pânico.Ela começou a tremer de nervosa,e o desespero veio às suas faces só de imaginar Ayumi sendo chicoteada e depois devorada viva por cães de corvos!
-Nãaaaaaao ! Não precisava matá-la ! Assassina ! Assassina ! Fora daqui sua...sua...assassina !
Ela começou a berrar, explodindo em lágrimas,ainda ajoelhada no chão,as mãos no rostos escondendo o ríctus do horror de suas faces conturbadas!
-A Maki-san tem razão, Izanami-sempai.Não havia necessidade de um castigo tão terrível assim!
Disse, corajosamente, por entre lágrimas, Hideo.
-Ela mereceu ! E depois, não fui eu quem a matou, foram os cães!E vocês dois são muito jovens, ingênuos e inocentes para entender o que é Honra, então não tem o direito de criticarem coisas que voc~es não sabem o que é, continuem a serem crianças e deixem as coisas sérias para os adultos, entenderam?
Kaede enxugou suas próprias lágrimas,e se recompondo com esfôrço,declarou:
-Eles tem razão sim, Izanami-sempai.Em última análise foi a senhora a culpada pela morte de sua sobrinha, pois se ela não estivesse tão ferida como provávelmente ficou, não teria morrido miserávelmente desta maneira tão cruel.Me desculpe, mas vou ter de chamar a Polícia!
Maki estava histérica e começou a bater com os punhos sem parar no peito de Izanami, que continuou fria como gêlo.
-Então chame.Sou uma mulher responsável e honrada , que assume as consequencias de seus atos.Fiz o que a tradição, a honra e a decência mandam,fiz o que tinha de fazer,Ayumi mereceu, fêz por merecer,e não me arrependo de tê-la punido, pois fiz o que minha consciência mandou, estou em paz com minha consciência,foi bem feito para ela,minha honra e honestidade permanecem intocadas e meu caráter, reto e inabalável, pois tenho a certeza de que fiz o certo.E faria de novo, se fosse o caso.Sem remorsos.Não tenho vergonha do que fiz, pelo contrário, tenho orgulho !
-A...a senhora é fria, é cruel, como pode colocar a Honra acima da vida humana?
-Kaede-san,a filosofia japonesa é clara: o indivíduo não é nada, a sociedade é tudo, e se o indivíduo não é útil à sociedade ou a prejudica, ele simplesmente não precisa existir.Não precisamos de indivíduos inúteis na sociedade!
-A senhora é um monstro! Não tem coração! Fora daqui ! Fora daqui ! Fora ! Fora!
Gritava Maki furiosa e fora de si.
Mas Izanami continuava com sua pose elegante, dominadora, pomposa, orgulhosa e arrogante.
-Hideo, por favor, ligue para a Akane-san, e peça para ela prender esta assassina confessa!
Disse Kaede, estupefata e revoltada com a crueldade daquela mulher !
Hideo obedeceu.Akane tinha sido acordada logo cedo para investigar o caso de Ayumi, e veio imediatamente.Izanami estava do lado de fora da casa, esperando altiva e orgulhosa.
-Eu formalmente acuso, na condição de testemunha de confissão, a senhora Izanami de ter assassinado sua sobrinha Ayumi, com requintes de crueldade!
Disse friamente Kaede, para Akane, quando esta chegou.
-Senhora Izanami, a senhora está presa em nome da Lei.Queira por favor estender seu braços para que eu possa algemá-la.
Izanami obedeceu, e entrou no carro de polícia.Akane abraçou Maki, que não parava de chorar.Depois entrou na viatura e  levou a criminosa para a delegacia.
Hideo ficou tentando consolar Maki, e ambos voltaram para o quarto deles e lá se trancaram.
Kaede ligou para Tetsuo, e coincidentemente, aquele era o dia em que a primeira aula da classe de Maki era a dele.Depois de escutar atentamente e ficar horrorizado com o que ouviu, ele desligou o celular, e falou para a classe:
-É com dor que informo à vocês, e a colega de vocês, desta classe, Ayumi-san, acaba de falecer horrívelmente, bárbaramente assassinada pela tia dela, ré confessa.Estão todos dispensados e vou falar agora com o Diretor, para declarar hoje com Dia de Luto Oficial.Devo dizer que por isto mesmo, os colegas de vocês, Maki-chan e Hideo-chan, não virão às aulas hoje.
A classe emudeceu.Muita gente pasma,mal acreditando no que ouvia!A comoção foi geral !
Tetsuo saiu da classe e foi para a sala do Diretor.
Imediatamente as aulas na escola inteira foram suspensas e os alunos dispensados.
Enquanto isto,Kaede seguia com seu carro para o hospital, para buscar Shinji.
Enquanto ia dirigindo, na volta, ela ia contando para o marido tudo o que ocorrera em sua ausência, menos, é claro, seu envolvimento emocional e sexual com Tetsuo.
Shinji escutava tudo calado.
Ao chegar em casa, ele trocou de roupas, e sentou-se na sua poltrona como sempre fazia, lendo o jornal, fumando cachimbo e tomando uma taça de vinho.
Foi quando Maki, finalmente recomposta do trauma da morte de sua colega e rival,desceu as escadas para apresentar Hideo para Shinji.
Kaede estava ao lado dela para servir docinhos ao marido, quando a loquaz Maki começou a falar sem parar da festa do dia anterior.
Shinji parecia querer ignorá-los e fazer de conta que eles não existiam.
Até que Maki falou demais, e contou das disputas de Kaede, Akane e Natsume por Tetsuo.E contou todas as traições de Kaede que sabia !
Kaede ficou pálida como cera, e tremia tanto que deixou cair a bandeja com os docinhos.
Shinji levantou-se de repente da poltrona,deixou o jornal cair no chão, e olhou para Kaede com olhar de fera.
-Vamos para o nosso quarto, Kaede-san!E vocês dois, me dêem licença!Anda!Saiam de perto de mim, parasitas inúteis ! Agora !
Maki ficou chocada com a rispidez de Shinji, e Hideo, sem dizer palavras, a tirou do caminho do idoso.Shinji pegou sua bengala de ponteira de prata e com ela empurrou as costas de Kaede, que mal conseguia se manter em pé , de tão nervosa que estava.As lágrimas já lhe corriam as faces e suas pernas tremiam a ponto de doer !
A porta do quarto deles se fechou.
Enquanto isto, Katashi já estava na porta da escola de Emi.Mas ela estava vazia, e uma placa de aviso dizia: "Fechada por luto."
Nervoso, ele decidiu que voltaria no dia seguinte.Não sossegaria até encontrá-la!

Ayumi já estava morta- mas seu irmão já ficara sabendo, e já tensionava fugir e se vingar de sua tia pela morte da irmã que ele amava!

(por continuar)

Nenhum comentário:

Postar um comentário