sábado, 2 de agosto de 2014

Sensibilidade de Viver Origens-Episodio 10






Enquanto isto, Lune seguia pelas ruas, em meio à multidão sem rosto.O que ela sentia? Nem ela sabia! Sua mente estava em um silêncio de morte, exausta, sem condições de pensar em nada!
Ao passar na frente da vitrine de uma livraria, quase que automaticamente, por força do hábito, ela resolveu entrar e do mesmo jeito foi na seção de filosofia e pegou um livro qualquer e começou a ler sentada numa cadeira sem nem entender o que lia.
Aos poucos, no decorrer das páginas, as palavras começaram a soar em sua mente e a fazer sentido novamente. Quando percebeu, estava lendo Lukáks,  e a frase "O proletariado se realiza somente após a sua abolição" irrompeu em sua mente e uma profunda vontade de analisar seu significado e interpretá-lo e  criticá-lo incendiou seu raciocínio como rastilho de pólvora!
Parecia um carro cujo motor tivesse morrido e sido dada uma nova partida e ele voltasse a funcionar de novo a toda a potência. Tal como os circuitos de um computador processando uma informação e acendendo luzes em sequencia, seu raciocínio foi se reorganizando numa sequencia harmônica e pulsante e em instantes sua dor de cabeça sumiu, a tristeza evaporou, e seus neurõnios trabalhavam a todo vapor para compor novas teorias mirabolantes. Sua mente tinha recomeçado a trabalhar e seu trauma, fora enterrado lá no fundo. Um sorriso iluminou seu rosto e a tristeza deu lugar ao entusiasmo juvenil. A velocidade da leitura aumentou exponencialmente num ritmo frenético e novas informações  eram acrescentadas, separadas e guardadas para compor novos raciocínios numa velocidade que deixaria outras pessoas tontas !
Quando as lembranças do seu trauma tentaram voltar a tona, Lune lembrou-se de Kierkegaard: "Sofrer é só uma vez, vencer é pela eternidade", e outra frase dele que ela adorava; "Ousar é perder o equilíbrio momentaneamente, não ousar é perder-se".
Foi o bastante para ela se consolar a si mesma e justificar sem comportamento e chegar à conclusão de que ela estava certa e fez o certo, evitando assim o remorso. Uma terceira frase do mesmo autor veio-lhe então à lembrança e lhe trouxe alento para continuar a se distrair e seguir em frente com sua vida: "A vida só se compreende mediante um retorno ao passado, mas só se vive para diante".
Pronto! Após esta breve pausa ela continuou a devorar o livro com os olhos e depois de Lukáks, foi ler "O conceito de Angústia" de Kierkegaard  e quando terminou, já estava quase escurecendo.
Alegre, fechou o livro e disse em voz alta:
-Adoro Kierkegaard ! Ele é tão lógico !
As pessoas ficaram olhando para ela, que deixou o livro sobre a mesa e saiu correndo para pegar o ônibus de volta para casa. Nem ligou para quem a estranhou e sorria de orelha a orelha !
Ao chegar em casa, Momiji dormia, mais calma, e Kazuo estava na biblioteca, telefonando para entregarem uma pizza para o jantar.
Ao ver a filha toda saltitante e feliz, Kazuo foi tomado pela surpresa, e, tendo terminado seu telefonema, viu que Lune exibia um raro e iluminado sorriso no rosto e o observava ao telefone.
-Oi, Pai, eu estou procurando o "Migalhas Filosóficas",  será que temos aqui? 

(por continuar)

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